Algumas
decisões políticas chamaram a atenção no decorrer deste ano. Vale a penar
mencioná-las para que não caiam no esquecimento. Elas revelam um projeto
político que, indiscutivelmente, está provocando sofrimento na vida dos
brasileiros. Não surpreendem porque o presidente eleito já falava de cada uma
delas durante a campanha eleitoral. Mesmo assim, parcela do povo brasileiro o
elegeu, pensando que um ex-capitão do exército, com quase trinta anos de vida
pública, sem fazer praticamente nada a favor do seu próprio estado, o Rio de
Janeiro, pudesse trabalhar para resolver os reais problemas de um país
continental como o Brasil.
Não é novidade para ninguém que o
atual presidente é, intelectualmente, muito fraco e desprovido de um projeto
político claro e capaz de melhorar a vida dos brasileiros. Isto era visível na
campanha eleitoral. O então candidato Bolsonaro sequer tinha plano de governo. Tudo
foi criado às vésperas do dia das eleições. Marcada por uma onda de notícias
falsas, veiculadas pelo Facebook e WhatsApp, a campanha do ex-capitão
conseguiu enganar uma parcela da população, que conseguiu elegê-lo presidente. Esta
parcela não constituiu a maioria dos eleitores brasileiros. A maioria dos
votantes não compareceu ao segundo torno das eleições, permitindo a vitória de
um político totalmente descomprometido com o bem comum.
Dadas estas considerações,
assistimos ao primeiro ano do governo Bolsonaro. Trata-se de um ano que aponta
para o como serão os próximos três
anos de mandato. Das várias medidas e acontecimentos que vieram a público
durante este ano, selecionamos aqueles que mais chamaram a atenção dos
brasileiros que gozam do bom senso. Apesar de tudo, ainda há inúmeras pessoas,
que votaram no ex-capitão, que ainda acreditam ser ele o Messias, o salvador da
pátria. Quais seriam os motivos que levam estas pessoas a continuarem acreditando
nesse messianismo político, misturado com um estranho cristianismo oportunista,
que tanto mal tem ocasionado à vida dos mais pobres do povo brasileiro?
Seguem as medidas e acontecimentos
que marcaram o ano político, que impactaram gravemente a vida do povo brasileiro
e que envergonharam o Brasil no cenário internacional:
ü O
governo enviou ao Congresso um projeto de lei complementar que visa usar
dinheiro público para socorrer os bancos. Não há dinheiro para maiores
investimentos em educação e outros setores, mas há para socorrer os bancos?;
ü Com o
objetivo de reduzir e, progressivamente, acabar com a autonomia das
universidades públicas, Bolsonaro impôs, por meio de uma Medida Provisória,
novas regras para a escolha dos reitores das universidades federais. Tal medida
caracteriza os governos autoritários;
ü Ricardo
Galvão, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), foi
demitido do cargo por mostrar ao mundo a real situação do desmatamento da
Amazônia. O presidente da República queria que o INPE escondesse a realidade,
para não manchar mais ainda a imagem do Brasil no exterior. Posteriormente, o
físico Ricardo Galvão foi incluído, pela famosa revista científica “Nature”, na
lista dos dez cientistas que mais se destacaram na área da ciência em 2019;
ü Neste
ano, não se ouviu mais, da boca do presidente, um de seus bordões de campanha: “Bandido
bom é bandido morto!” Analistas perceberam o sumiço deste bordão desde que veio
a público o escândalo de corrupção envolvendo o filho do presidente e o amigo
da família Bolsonaro, o Queiroz, que continua sumido;
ü Pela
primeira vez nos últimos anos, um presidente da República se volta contra Paulo
Freire, Patrono da Educação Brasileira, um dos educadores mais influentes do
mundo. Bolsonaro o chamou de “energúmeno”. Tal fato contribuiu mais ainda para
queimar a imagem do Brasil no exterior;
ü Como se
tivesse gastando do próprio bolso, Bolsonaro impôs sigilo nos gastos do cartão
corporativo da presidência da República. Considerando que se trata de dinheiro
pública, o STF derrubou o sigilo. Mesmo assim, o presidente insistiu no sigilo
dos gastos, numa clara demonstração de falta de transparência no uso do
dinheiro público;
ü Pela primeira
vez na história do Palácio do Planalto, a bancada “evangélica” conseguiu fazer
um culto religioso na residência presidencial, contando com a presença do
representante da Igreja Universal do Reino de Deus; prova evidente da
preferência do presidente da República pelo protestantismo em detrimento das
demais denominações religiosas. O Estado somente é laico na letra da
Constituição;
ü Bolsonaro
foi denunciado no Tribunal Penal Internacional (TPI) por incitar o genocídio e
promover ataques sistemáticos aos povos indígenas do Brasil. Mesmo não seja
condenado, a imagem do presidente já está gravemente comprometida no cenário internacional.
Isto também afeta a imagem do Brasil na comunidade internacional;
ü Neste ano,
o Superior Tribunal Militar (STM) julgou 1.036 processos envolvendo a posse e o
uso de drogas nos quartéis. A tese bolsonarista de que não existe corrupção
entre os militares é mentirosa. Estamos falando de um tipo de crime, apenas. Há
muitos outros;
ü Misteriosamente,
apareceu óleo poluindo as praias do nordeste. Como a maioria dos nordestinos
não votou no presidente, este não se mexeu para resolver o problema. Depois de
muitas críticas, mandou a Marinha do Brasil ajudar na limpeza;
ü O presidente
tentou colocar o próprio filho, Eduardo Bolsonaro, que não domina sequer a
língua inglesa, como embaixador do Brasil nos EUA. De tanto tentar, desistiu,
dada a resistência no Congresso Nacional e no meio diplomático;
ü Neste mês
de dezembro, a carne teve um aumento de 17,7%. A ministra da Agricultura
sinalizou que o preço não vai cair. O aumento atinge os mais pobres do povo;
ü Foram liberados,
para registro e venda, 474 novos agrotóxicos. A medida beneficia os fabricantes
e prejudica a saúde dos brasileiros;
ü Para piorar
a Reforma Trabalhista, que já beneficiava os patrões, o governo editou a “MP da
Liberdade Econômica”, aumentando os benefícios aos empresários em detrimento
dos trabalhadores;
ü O site
The Intercept Brasil publicou
inúmeras conversas do então juiz Sérgio Moro, atual ministro da Justiça, com
procuradores da Lava Jato, que levaram a entender a escandalosa parcialidade do
juiz na condução dos processos da Operação, principalmente nos processos
envolvendo o ex-presidente Lula. As conversas não foram investigadas, pois
Sérgio Moro é chefe da Polícia Federal;
ü O
ministro do Turismo do governo Bolsonaro está sendo investigado pela Polícia
Federal, indiciado por envolvimento no escândalo de candidaturas laranjas do
PSL (partido do Bolsonaro nas eleições 2018);
ü O
presidente tentou acabar com os radares móveis nas rodovias federais, impedindo
a instalação de 8 mil radares. Mas a Justiça Federal impediu a tragédia;
ü Visando
beneficiar o próprio filho, acusado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro
de ser o chefe de uma organização criminosa no RJ, o presidente usou o pacote
anticrime do ministro Sérgio Moro para aprovar a figura do “juiz de garantias”,
que impede o atual juiz do caso que envolve o filho do presidente de sentenciá-lo
ao final do processo;
ü A
Reforma da Previdência, que mais beneficia os ricos que os pobres, foi aprovada
neste ano. O brasileiro terá que trabalhar por mais tempo para receber o
salário integral;
ü O
governo facilitou o acesso às armas de fogo no Brasil. A medida ajudou a
indústria de armas, mas não resultou no aumento da segurança. A maioria do
povo, sem dinheiro para comprar o necessário para viver, continua desarmada e exposta
à violência;
ü Para beneficiar
os empresários, o governo acabou com a multa de 10% paga pelas empresas ao
governo nas demissões sem justa causa de empregado;
ü O governo
tentou acabar com o seguro DPVAT, mas o STF não permitiu;
ü O
salário mínimo aprovado para 2020 é de R$ 1.031. Para assegurar novas vantagens
para a carreira militar, o governo reservou 4,7 bilhões de reais no orçamento
de 2020. Este valor é destinado somente às vantagens que serão criadas;
ü O desmatamento
na Amazônia cresceu assustadoramente. A grilagem de terra é o principal
causador do problema. O governo demonstra pouco interesse em resolver o
problema. A situação virou motivo de chacota no seio do governo federal;
ü O setor
que mais sofreu cortes e perseguições do governo federal foi o da educação. Acredita-se
que com menos recursos a educação melhora! É a lógica do atual governo;
ü O
número dos que estão na extrema pobreza no Brasil é de 13,5 milhões de pessoas.
Estas sobrevivem com 145 reais mensais. O governo não está preocupado com o
problema;
ü O número
de desempregados no Brasil é de 11,9 milhões de pessoas. Até o presente momento
o governo federal não apresentou nenhuma solução para este grave problema, e o
assunto sequer é mencionado nas falas do presidente;
ü Neste ano,
o preço do gás de cozinha acumulou alta de cerca de 10%.
Finalizamos estes breves apontamentos, com estas tristes
medidas adotadas pelo governo, com algumas questões que podem nos ajudar a
pensar a situação: Por que a grande maioria do povo brasileiro está assistindo
calada à implementação destas medidas prejudiciais? Por que a classe média, que
foi às ruas na época do governo da presidenta Dilma, está calada, sem reação? E
os eleitores do presidente Bolsonaro, não reagem por vergonha, ou por cegueira?
Esta passividade está alicerçada no medo, na vergonha, na alienação, na
indiferença, ou na falta de perspectiva política? Vamos pensar um pouco.
Tiago de França