“Portanto, sede perfeitos como
o vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48).
Por acaso, podemos alcançar a
perfeição? Certamente, não. Quem pode ser perfeito como Deus? Então, por que
será que Jesus pede isso a seus seguidores? Os versículos anteriores, que
formam o capítulo 5 de Mateus, respondem perfeitamente a esta indagação.
Meditemos sobre Mateus 5,38-48.
O texto começa fazendo referência à
lei de talião: “Olho por olho e dente por
dente!” Os seguidores de Jesus não podem praticar esta lei. Jesus recomenda
que não se deve enfrentar quem é malvado. Geralmente, o que as pessoas fazem
com o malvado? Desejam a sua morte, ou resolvem matá-lo, imediatamente. Jesus
afirma que tais pessoas estão contrariando o mandamento de Deus.
Facilmente, as pessoas aderem à
cultura da vingança, pagando o mal com o mal. O ódio toma conta, e o desejo de
morte controla as relações humanas. Há uma recusa à pacificação. Muitos semeiam
o ódio, porque desejam uma sociedade banhada de sangue.
Para ilustrar, eis um exemplo: O atual presidente da
República do Brasil, com seu projeto de facilitar o acesso às armas, prega a
lei de talião. Publicamente, induz as pessoas à violência: Se uma pessoa te
ameaça, mate-a, pois “bandido bom é bandido morto!” O mesmo presidente afirma
ter fé em Jesus. Na verdade, desconhece o Evangelho de Jesus, porque pratica o
oposto.
Ensinando seus discípulos a serem pacíficos, Jesus continua:
“Amai os vossos inimigos e rezai por
aqueles que vos perseguem!” Geralmente, as pessoas querem matar seus
inimigos, desejando-lhes toda espécie de mal. Esta não deve ser a postura de um
seguidor de Jesus.
Jesus não está inocentando a quem faz o mal, nem insinuando
a criação de uma sociedade pautada na anarquia. Não se trata disso. O que está
ensinando é a via do amor como caminho eficaz de conversão. Todas as pessoas
precisam ser amadas, pois é o amor que as transforma. O amor cessa a inimizade
entre as pessoas, e acaba com a cultura da eliminação do outro; cultura de
morte, portanto, antievangélica.
O ódio e as demais formas de violência não resolvem o
problema do conflito entre os seres humanos. Não é matando as pessoas que
diminuiremos nem acabaremos com a violência. Matar é, por si, um ato violento.
Eliminar o outro é violência, crime e pecado grave. Aquele que é considerado
inimigo e perseguidor merece o nosso amor, pois esta é a reposta indicada por
Jesus.
O próprio Jesus nos ensinou o caminho: Não era um homem
violento, mas pacífico. Até no momento da morte, perdoou aqueles que o mataram.
A violência cresce por causa do ódio, da indiferença e das desigualdades de
toda ordem. As pessoas pensam que a destruição do outro resolve o problema da
violência. Muita gente lucra muito dinheiro com esta cultura de morte. O ser
humano é capaz de lucrar com a desgraça de seu semelhante!
A indiferença também provoca a morte do outro. A pessoa
indiferente trata o outro como se este não existisse. Toda pessoa precisa ser
percebida, encontrada, tocada, cuidada, enfim, amada. A pessoa indiferente não
pratica nada disso, mas dominada pelo egoísmo, está centrada em seus próprios
interesses. No seio da religião cristã também encontramos muitas expressões do
ódio e da indiferença: discursos, olhares e práticas que julgam, condenam,
excluem e matam.
Jesus afirma que para nos tornarmos filhos do Pai que está
nos céus precisamos ser pacíficos, amando os nossos inimigos e rezando por
aqueles que nos perseguem. Precisamos amar não somente aqueles que nos amam,
porque se assim procedermos, não estamos fazendo nada de extraordinário. É
necessário amar a todos, sem distinção, pois é assim que o Pai celeste ama seus
filhos e filhas.
Numa sociedade
marcada pela violência, estas palavras de Jesus aparentam ser utópicas demais.
Talvez seja pelo fato de sermos acostumados ao clima de violência. Quando esta
se torna normal e até necessária, ser pacífico parece coisa de gente ingênua. Mas
Jesus não está ensinando ingenuidade, mas comunhão fraterna. Como defender a
comunhão se enxergo o outro como inimigo a ser eliminado? Como participar da
comunhão eucarística, enxergando o outro como inimigo?... Em Cristo Jesus, o
outro é irmão e amigo, companheiro de caminhada rumo à plenitude do Reino.
Em sintonia com o texto evangélico, não tenhamos medo de
anunciar esta verdade: Quem enxerga o
outro como inimigo a ser combatido e eliminado, não está em comunhão com Jesus
e seu Evangelho. A fé cristã é incompatível com a hostilidade e a exclusão
das pessoas.
Onde há exclusão não há fé. Portanto, ser perfeito como o
Pai celeste é perfeito significa ser amoroso e pacífico, pois fora do amor não
há perfeição. Ser perfeito não é ser sem defeitos, mas ser misericordioso e
manso, aberto ao outro para amar servindo. Por fim, vale lembrar o que nos
ensina o apóstolo João ao nos dizer que “aquele que não ama permanece na morte”
(1Jo 3,14). Para viver é preciso amar. No amor somos perfeitos. Este é o
caminho que conduz à salvação.
Tiago de França