domingo, 26 de julho de 2020

O essencial e o supérfluo


“O Reino dos Céus é como um tesouro escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio de alegria, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo” (Mt 13,44).
            As pessoas podem passar toda a vida se ocupando com o essencial, ou com o supérfluo. No cristianismo, o essencial é Jesus. Este Reino dos Céus de que fala o evangelista Mateus é o próprio Cristo. Como diria Orígenes, Jesus é o Reino de Deus em pessoa (autobasileia). A parábola fala de um tesouro escondido, e o que está escondido precisa ser descoberto. Jesus precisa ser descoberto. É possível que muitos cristãos passem a vida toda invocando o nome de Jesus sem descobri-lo na vida.
            A descoberta de Jesus passa, necessariamente, pela experiência da proximidade. É necessário se aproximar dele, na liturgia, nos sacramentos e na vida cotidiana. Ele está nas Escrituras, na Eucaristia e nos demais sacramentos. Estes são sinais que manifestam a sua presença. Mas esses sinais não estão desligados da vida cotidiana. Assim, quando criamos laços de fraternidade com as pessoas, então estamos vivendo essa proximidade com Jesus. As pessoas são sacramentos de sua presença.
            A parábola diz que o homem encontra o tesouro e é tomado por uma grande alegria. Encontrar-se com Jesus é conhecer e experimentar a verdadeira alegria da vida. Não se trata de uma alegria ingênua, nem passageira, mas daquela que transforma interiormente a pessoa, tornando-a leve e disposta para enfrentar os dilemas da vida. O evangelho de Mateus foi escrito para uma comunidade que enfrentava tribulações. A vida é cheia de tribulações, e exige que o discípulo de Jesus seja alguém cheio da sua alegria.
            Mas não bastou ao homem da parábola somente ficar alegre. Ele tomou a firme decisão de vender todos os seus bens para comprar o campo, onde estava o tesouro. Agindo assim, reconheceu o valor do tesouro escondido e se empenhou em tê-lo para si. Essa atitude nos faz pensar a respeito da nossa busca e interesse por Jesus, única riqueza da vida do cristão. O que estamos fazendo para permanecer com Jesus? Será que estamos deixando Jesus de lado para nos dedicar a outras coisas que julgamos mais importantes?
            No seio de nossas Igrejas há a grande tentação de se marginalizar Jesus. Muitas vezes, a procura é por outras coisas. Em nome de Jesus, muitas coisas erradas são feitas e ditas. Em nome dele, muitos procuram dinheiro, sucesso, poder, status etc. Pronuncia-se o nome de Jesus para legitimar interesses mesquinhos e mundanos. Assim, cria-se um cristianismo das aparências, da estética bem trabalhada, do discurso vazio e de práticas indignas do cristão. Usando uma expressão do Papa Francisco, vive-se o mundanismo espiritual.
            Esse mundanismo espiritual se manifesta naquelas situações em que somente encontramos superficialidades. O materialismo e a vaidade tentam se esconder por trás de rostos angelicais e de aparência de santidade. Cria-se um ambiente fervorosamente religioso, mas sem caridade com o próximo. A malícia se esconde por trás das invocações incessantes do nome de Deus. O cristianismo atual está sofrendo muito desse tipo de enfermidade.
O mundanismo espiritual é a manifestação mais evidente do que podemos chamar de corrupção religiosa. A religião não foi criada com este propósito. Jesus foi muito severo com esse tipo de procedimento, ao reprovar a conduta dos mestres da lei e fariseus, que usavam do aparato religioso para se apresentar como homens santos, bem como para explorar os mais simples do povo de Deus. O mundanismo espiritual revela a religiosidade que não liga o homem a Deus, mas o desvia do caminho que conduz a Deus.
Quando apontamos para a lua, o mais importante não é o dedo que aponta, mas a beleza da lua que precisa ser contemplada. O mesmo deve ocorrer na vida cristã, quando apontamos para Jesus, o mais importante é Jesus. Do contrário, quando se utiliza do aparato religioso (vestes, rituais, sacramentos e sacramentais, símbolos em geral, doutrina etc.) para que brilhe a pessoa que aponta e não o próprio Cristo, então temos um problema que merece reflexão e solução. É Jesus o centro da vida eclesial e cristã.
Tudo o que atrapalha o cristão na sua caminhada para Deus é desvio. Tudo o que ofusca Jesus na vida da Igreja é supérfluo e precisa ser reprovado e deixado de lado. Jesus é a Luz que não pode ser ofuscada. Na vida cristã é preciso ver o que é essencial e o que é supérfluo. No centro da vida da Igreja não está Maria, os santos, os anjos, a doutrina, a hierarquia eclesiástica, a pomposidade das cerimônias, o dízimo, as grandes edificações, entre tantas outras coisas. Nada disso. No centro da vida da Igreja está Jesus Cristo, Senhor e Salvador. Tudo deve convergir para Ele.
E antes que o leitor pense que Maria, os santos, os anjos, a doutrina, a hierarquia, o dízimo, as edificações etc. não são importantes, afirmo que são. Mas nada deve ocupar o lugar de Jesus. Insisto nisso porque temos assistido a certa multiplicação de práticas e usos no seio das Igrejas cristãs que tendem a tirar Jesus do centro. Isso é muito grave e perigoso. Se ao olharem para um cristão, as pessoas não enxergarem nada que as façam lembrar de Jesus, então temos um estilo de vida desse cristão é equivocado. A doutrina cristã é clara: O cristão deve refletir Cristo.
A caridade, a fé, a esperança, a sobriedade, a moderação, o cuidado, o respeito, a tolerância, a humildade, a mansidão, o despojamento e tantos outros valores integram o essencial. São valores que revelam que o essencial ocupa o centro da vida. A cultura da aparência e o apego ao que é transitório explicitam o supérfluo que prende a aliena. O seguimento de Jesus não é uma experiência superficial, mas adesão que transforma radicalmente a vida do discípulo; não é algo passageiro, mas que permanece.
É necessário procurar Jesus para ter a vida nele. Quem o encontra, tem a segurança necessária para viver e ser feliz. Entregar-se a Ele é a melhor escolha. É um caminho que vale a pena, pois é caminho de plenitude e paz.
Para tornar-se verdadeiramente humano, o cristão precisa colocar Jesus no centro de sua vida. Ele é a rocha e a seiva, o caminho e a porta, a bússola, o Pastor e a salvação. Por Ele somos justificados diante de Deus. Seu amor nos envolve e nos torna justos. Se estamos a Ele ligados, então não precisamos ter medo, mas podemos caminhar com passos firmes e orientados pela sua voz. Assim, a vida do discípulo se torna uma bela e gratificante aventura de amor. Quem não se aventura com Cristo, não conhece nada disso.

Tiago de França

2 comentários:

Unknown disse...

👏👏👏

Luishenrique disse...

O cristão não precisa ficar feliz só pela religião..., mas "vêr jesus" no seu cotidiano.