“Agora, diz o Senhor: voltai para mim com todo o coração, com jejuns, lágrimas e gemidos; rasgai o coração, e não as vestes; e voltai para o Senhor, vosso Deus; ele é benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia, inclinado a perdoar o castigo” (Joel 2,12-13).
Com estas palavras da profecia de
Joel, a Igreja Católica convida seus membros a iniciarem o itinerário
quaresmal. Quaresma é tempo de voltar para o Senhor, com todo o coração. Não se trata de uma experiência passageira, mas
de um itinerário permanente, marca do processo de conversão. O Senhor pede para
rasgar o coração, e não as vestes; ou seja, é um retorno para com Ele
permanecer. A conversão do coração é radical, porque transforma a pessoa,
conferindo-lhe um novo alento e orientação de vida.
As lágrimas e os gemidos sinalizam o
reconhecimento da condição frágil e limitada, que integra o humano. Escrevendo
aos coríntios, o apóstolo Paulo recomenda: “Como
colaboradores de Cristo, nós vos exortamos a não receberdes em vão a graça de
Deus” (2Coríntios 6,1). Não há conversão sem abertura à ação da graça de
Deus. Ninguém muda de vida sem o auxílio da graça divina. O Senhor que convida
ao encontro com a sua misericórdia é o mesmo que infunde a graça que opera no
coração.
Na mesma Carta, acrescenta o
apóstolo: “É agora o momento favorável, é
agora o dia da salvação” (6,2). É preciso aproveitar o tempo da ação de
Deus. Ele envia a sua graça no momento certo, porque não age conforme os planos
humanos, mas trabalha para que seu Reino se torne uma realidade plena. Ele não
olha para a multidão dos pecados, mas deseja entrar no coração das pessoas.
Respeitando a liberdade humana, simplesmente pede para entrar e realizar as
suas maravilhas. É belo e fecundo o trabalho divino no coração humano. Deus age
no humano, divinizando as pessoas, restabelecendo aquela imagem e semelhança do
ato criador descrito no Gênesis.
A profecia de Joel revela também que
o Senhor é benigno e compassivo, paciente
e cheio de misericórdia. Esta é a verdadeira imagem de Deus. A sua bondade
é infinita, inclusiva, porque capaz de alcançar a todos, especialmente os que
mais precisam do seu amor. Ele é compassivo, porque conhece do que o ser humano
é feito. É conhecedor de todas as coisas. Em Cristo, conheceu a realidade
humana, com suas dores e alegrias. Não é indiferente ao sofrimento de seus
filhos e filhas; pelo contrário, é compassivo. Não é dado à vingança, mas é
puro amor.
Deus é paciente e misericordioso.
Não se deixa dominar pela ira, quando seus filhos pecam. É cheio de ternura, e
não se cansa de perdoar. Por isso, todo pecador pode, a qualquer tempo,
voltar-se para Ele, implorando a sua misericórdia. Deus perdoa, infinitamente,
e acredita sempre na possibilidade da conversão do coração dos rebeldes e
indiferentes. Sendo paciente, espera o retorno daqueles que se aventuram nos
descaminhos deste mundo. Permite que o mal aconteça não porque seja mau, mas
porque criou o ser humano livre, e trabalha para salvá-lo na liberdade. O
Senhor não força nada. Quem se deixa se envolver pelo seu amor jamais volta à
casa da escravidão, porque encontrou a razão de viver e a salvação.
No evangelho (cf. Mateus
6,1-6.16-18), encontramos Jesus ensinando a fazer caridade, a jejuar e a orar,
três práticas acentuadas no tempo da Quaresma. Ser caridoso é ser solidário com
os que sofrem. Os que passam bem, sendo indiferentes aos que passam mal, na
verdade, não estão bem diante do Senhor. Os que tem com o que viver sem se
importar com aqueles que nada tem não podem dizer que acreditam em Deus. O
Senhor é Pai e todos somos irmãos. Ignorar os outros, negando-lhes o devido
socorro é atestar a própria falta de fé.
Também o jejum está atrelado à
caridade. O jejum que agrada ao Senhor está intimamente ligado à comunhão
fraterna. Nesta comunhão se vive a fraternidade, e esta não existe sem a
caridade. Os que jejuam, fechando-se aos outros, perdem seu tempo. Fora da
comunhão fraterna, o jejum se transforma em hipocrisia, abominável aos olhos do
Senhor. A caridade e o jejum devem ser vividos na discrição, distante da mania
de em tudo querer aparecer. Os que procuram elogios não receberão de Deus
nenhuma recompensa, pois já são recompensados pelos que os elogiam.
O Senhor também ensina a orar. A
recomendação é a mesma: é preciso orar no silêncio do coração, sem chamar a
atenção dos outros. No seio das Igrejas cristãs, certas práticas de oração não
têm outra finalidade senão a busca por elogios e aplausos. As câmeras dos
celulares registram o semblante angelical de muitos que vivem orando em pé, nas
igrejas e nas esquinas das praças, para
serem vistos pelos homens. Quanto maior o brilhantismo, maior é o vazio das
orações dos hipócritas! Há muito barulho e muitas selfs, mas pouca oração e comunhão com o Senhor.
O resultado da ausência da
verdadeira oração é a ausência de conversão. Há muitos que oram, mas não
abandonam o caminho da iniquidade. Louvam a Deus com os lábios, mas o coração
está distante do Senhor (cf. Isaías 29,13). Não há conversão possível quando o
coração está distante do Senhor, fechado em si mesmo, habitado e dominado pelo
mal. Sem oração não é possível se colocar no caminho de Jesus e nele
perseverar. Orar não é somente pronunciar fórmulas e palavras ao Senhor, mas buscá-lo,
diuturnamente, para fazer a Sua vontade. A oração exige este permanecer na
presença do Senhor, para viver unido a Ele.
A adoração que se deve prestar ao
Senhor é em espírito e verdade (cf. João 4,23), ou seja, na liberdade dos
filhos de Deus, independentemente de religião e lugar. O Senhor está em toda
parte, e pode ser encontrado por toda pessoa que o procura de coração sincero. Ele
é acessível, porque próximo e atento; não dorme nem cochila (Salmo 121,4). A
comunhão com Ele vai além do culto oferecido nos templos religiosos, porque o
que lhe agrada é o permanecer nele, em espírito e verdade. Na oração, o Senhor
se revela e faz o orante conhecer a sua vontade, seu amor e sua salvação. É uma
experiência extraordinária no ordinário da vida humana. Na oração é possível
ter acesso ao mistério de Deus revelado em Cristo.
Neste ano, durante a Quaresma, a
Campanha da Fraternidade, que há décadas é realizada no Brasil, será ecumênica
e terá como tema “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor”. Dialogar é uma
exigência fundamental do caminho de Jesus. A conversão passa, necessariamente,
pelo diálogo. Os que dialogam com o Senhor na oração devem dialogar com o
próximo no cotidiano da vida. Sem diálogo não existe comunidade, e sem esta não
existe Igreja. Para viver em comunhão é preciso dialogar, respeitando a
pluralidade de ideias e formas de ser e de agir. O Senhor se recusa àqueles que
se fecham ao diálogo frutuoso com o próximo, porque não se ama a Deus e ao
próximo sem o diálogo.
As resistências à Campanha da
Fraternidade Ecumênica revelam a necessidade do diálogo. Revelam também a
necessidade da conversão do coração. Há uma cultura do ódio e da eliminação do
outro infiltrada no seio das Igrejas cristãs. Mas o amor de Deus, semeado nos
corações das mulheres e homens de boa vontade é infinitamente superior a todo
espírito de discórdia. A mentira não é superior à verdade; pelo contrário, a
verdade liberta da mentira e desmascara o mentiroso. Os que escutam a voz do
Senhor não seguem os mercenários e oportunistas, mas aderem ao amor que gera
comunhão e paz. A Campanha é para gerar fraternidade; os que a ela se opõem não
desejam promover o diálogo e a paz.
A fé em Jesus exige diálogo,
comunhão e promoção da justiça e da paz. Os que se dedicam ao ataque
sistemático da fé e da comunhão eclesial não prosperarão. Nenhuma forma de
violência pode ser legitimada. A violência contra a Campanha da Fraternidade
deste ano não possui legitimação alguma. Os que professam a fé em Jesus e
possuem consciência de sua missão no mundo devem promover a verdade, jamais a
mentira e a confusão. A polêmica em torno da Campanha não é, nem será capaz de
impedir a sua realização frutuosa, porque vivemos em um país que clama por
justiça e paz. Cristo é nossa paz, e os inimigos desta paz serão vencidos.
Feliz
e fecundo itinerário quaresmal, rumo à Páscoa do Senhor!
2 comentários:
Iremoos vencer sim amem
Deus abençoe a todos do blog.
Gostaria de contribuir também deixando um artigo aqui bem completo sobre Jesus.
Espero que gostem.
https://conselheirocristao.com.br/jesus/
Postar um comentário