segunda-feira, 24 de março de 2008

O processo de formação do seguidor de Jesus

O processo de formação do discípulo missionário

O presente artigo tem a intenção de refletir sobre o processo de formação de um discípulo missionário de Jesus Cristo, levando em consideração o Documento de Aparecida (DA), aprovado na V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe, ocorrida no ano passado, em Aparecida, SP – Brasil. Em primeiro lugar, precisamos afirmar que toda pessoa batizada é chamada a seguir Jesus. A missão é seguir Jesus. Para que possamos seguir Jesus precisamos nos comprometer com aquilo que ele disse e fez quando esteve neste mundo. A efetivação da proposta se dá no seguimento e no compromisso. O sentido destas duas palavras está interligado. Não pode haver seguimento sem compromisso. E todo aquele que se compromete com Jesus, implícita e explicitamente já é um discípulo missionário. O número 276 do DA diz: “Àqueles que aceitaram segui-lo, os introduziu no mistério do Reino de Deus, e depois de sua morte e ressurreição os enviou a pregar a Boa Nova na força do Espírito Santo”. Jesus nos faz um convite, temos a liberdade de aceitar ou não. Este é um dado importante, porque muitos pensam que todos estão obrigados a seguir Jesus. Ninguém está obrigado a nada. O seguimento a Jesus se dá na liberdade e para a liberdade. A verdadeira vocação se vive na liberdade. Quem não é livre não pode seguir Jesus. Jesus nos quer livres. O seguimento requer posturas de liberdade. O convite é para escolhermos. A opção é nossa. Jesus nos chama e nós respondemos, cabe-nos responder e corresponder ao chamado de Deus. A religião não pode obrigar ninguém a aceitar e seguir Jesus. A resposta livre pertence à pessoa, ou seja, ninguém pode responder por ninguém. Quando aceitamos seguir Jesus, somos introduzidos no mistério do Reino de Deus. Esta introdução ao mistério não foi privilégio somente dos discípulos que estiveram com Jesus. Se somos sucessores da missão evangelizadora dos Apóstolos pelo batismo, também somos introduzidos no mistério do Reino de Deus. O número 382 do DA, entre outras palavras, diz: “Jesus Cristo é o Reino de Deus que procura demonstrar toda a sua força transformadora em nossa Igreja e em nossas sociedades”. Jesus é o Reino de Deus. Jesus tem uma força que transforma. Quando não há mudança e transformação é sinal de que não há a presença da força de Jesus. Esta força de Jesus se manifesta na Igreja, nas sociedades e na totalidade do mundo. A força de Jesus se manifesta mais no meio dos pobres. O pobre é o lugar da transformação. Toda verdadeira transformação nasce da base da sociedade. A força de Deus se manifesta nos pobres e por meio dos pobres. Isso explica o fato de a Igreja Latino-americana ter feito a opção preferencial pelos pobres. Então, o descobrir e deixar-se envolver pelo mistério do Reino de Deus é fazer a experiência de Deus no meio dos pobres. O pobre é o lugar da experiência com Deus. Jesus viveu a sua relação com o Pai no meio dos pobres. O evangelho mostra claramente isso.
Assim sendo, antes de qualquer coisa precisamos conhecer Jesus. Não podemos segui-lo, sem antes conhecê-lo. Não se segue um desconhecido. A missão da Igreja é justamente fazer com que as pessoas percebam que Jesus está no meio de nós. Ninguém leva Jesus a ninguém. Jesus está no meio de nós. A missão é identificar onde a força de Jesus se manifesta.
Quando soubermos onde está a força de Deus, saberemos onde está Deus. Esse processo de identificação se dá no cotidiano da vida e não é algo abstrato nem sobrenatural. Quando Deus quis se revelar ao gênero humano, não precisou elevar o homem a um alto grau de contemplação ou êxtase, mas desceu a nós, encarnando-se em nosso mundo. Mundo este que não é maldito como muitos pensam. O seguimento de Jesus se dá a partir do mundo e para o mundo. Uma pessoa não se converte para si nem para Deus, mas se converte para o outro, para o bem do outro e dom mundo, em vista da construção do Reino. A conversão não é um sentimento nem um estado de fé direcionado ao céu, em que devo me esforçar para que minha alma seja salva, mas é um processo que perdura por toda a vida, que ocorre na relação fraterna entre as pessoas, por meio do amor. Não se conhece Jesus somente pela leitura de sua Palavra ou através do magistério eclesiástico. Para conhecer Jesus a pessoa precisa segui-lo, colocar-se a caminho. É preciso fazer a experiência. O DA aponta cinco aspectos fundamentais que compõem o processo de formação de um seguidor de Jesus: o encontro com Jesus, a conversão, o discipulado, a comunhão e a missão. Cada aspecto desses requer um estudo aprofundado, pois precisamos buscar saber o sentido de cada um deles. O que vem a ser o encontro com Jesus? Quando queremos encontrar alguém, saímos à procura deste alguém. Este deve está em algum lugar. Qual é o lugar? Onde Jesus está? Se é necessário encontrar-me com Jesus, então devo procurar saber onde ele está. A partir da leitura do Evangelho de Jesus veremos que ele tinha muito interesse em estar ao lado das pessoas sofredoras e oprimidas. Todo o Evangelho mostra Jesus em meio aos sofredores. Podemos concluir que em todas as ocasiões de sofrimento e opressão Jesus se faz presente. Ele está encarnado em nossa realidade, ensinando e nos despertando para a vivência do amor. Quando amamos as pessoas estamos fazendo a experiência de Deus, e aí está o encontro com Jesus. Depois do encontro, acontece a conversão. É justamente o encontro com Jesus que converte as pessoas. Quando nos encontramos com Jesus mudamos de vida, como fez muitas pessoas tidas como pecadoras no Evangelho. O encontro e a conversão não acontecem necessariamente dentro das Igrejas. Não são nossas Igrejas que nos convertem, mas a força transformadora do amor e da Palavra de Deus. Muitos não faltam em nossas Igrejas porque pensam que estão convertidos pelo fato de estarem presentes nos cultos e celebrações. Estes são importantes, porque celebram a conversão da pessoa, mas não é lugar nem o momento da conversão. Se a conversão é algo concreto da vida da pessoa, então não podemos afirmar que tal culto ou celebração me converteu... Nunca esqueçamos de ligar conversão e vida. A conversão não é uma emoção momentânea, mas um processo cotidiano da vida do cristão. Até a hora de nossa morte estamos nos convertendo... Toda a nossa vida é uma busca constante de Deus...
Depois que encontro Jesus e me converto já me tornei seguidor. Não pode haver seguimento sem o encontro e a conversão. Como posso proporcionar aos outros o encontro com Jesus se eu mesmo não vivi tal encontro? Como posso ajudar o outro a se converter se eu mesmo não busco me converter? Ninguém está convertido plenamente, estamos numa busca constante, caminhando nas estradas de Jesus. E quem está caminhando não pode ousar dizer que chegou ao lugar de destino. Somos chamados a caminharmos juntos, um ajudando ao outro a se converter. O discipulado é este caminhar nas pegadas de Jesus, buscando viver o que ele viveu apesar das limitações que nos são inerentes. O DA aponta dois fatores necessários nesta fase: catequese permanente e vida sacramental. Estes ajudam na vivência do discipulado. Neste, a pessoa amadurece mais a sua fé e aprofunda-se mais nas convicções cristãs e no conhecimento de Jesus Cristo. O discípulo precisa estar consciente de sua vocação e missão. E esta consciência nasce do conhecimento do Mestre. Acolher, entender e viver os ensinamentos de Jesus é exigência para o verdadeiro seguimento. A maioria de nossos cristãos não entende a fé que professa. A falta de conhecimento de Deus é um mal em nossas Igrejas. Muitos invocam a Bíblia, mas desconhecem seu conteúdo. O DA apontou como necessidade urgente a formação das consciências dos cristãos, pelo menos daqueles que professam sua fé na comunidade eclesial.
O discípulo de Jesus não caminha sozinho no mundo. O discípulo vive e promove a comunhão entre os irmãos: entre os que professam o mesmo credo e os de outras confissões religiosas. A unidade dentro da comunidade eclesial é como um selo de reconhecimento e é condição necessária à vida de cristãos. A falta de unidade entre os cristãos é sinal vivo de que ainda não aprenderam a interpretar a Palavra de Deus nem a vivê-la. A verdadeira interpretação e a vivência da Palavra não ocasionam separação nem discriminações. Muitos não se cansam de anunciar com a boca que Jesus é o Príncipe da Paz, mas que constantemente se recusam em viver em paz com os outros de diferentes formas de pensar e de servir a Deus. Muitos conflitos e até guerras se deram e se dão por causa do sagrado. Este, às vezes, torna-se motivo de rixas entre pessoas e denominações religiosas. Os cristãos, às vezes, parecem um bando de pássaros, que em determinada fase da vida precisam sair para outras regiões em busca de alimento, mas que não sabem que direção tomar... A Palavra de Deus tornou-se um meio de vida e muitos dedicam toda a vida em enganar e viver à custa da boa fé dos inocentes, que não entendem do significado da Palavra que escutam. Ai dos que se aproveitam da ignorância dos pobres, tirando o que lhes resta para sobreviver!... o cristão coerente precisa anunciar Jesus ao mundo e denunciar as forças da morte que se manifestam todos os dias. O Espírito Santo nos ajuda nesta missão. Ele nos inspira e nos encoraja na difícil missão de ser cristão em tempos de pós-modernidade. Sintamo-nos abraçados e abrasados por esta força que vem do Alto e que ela nos reúna num só povo, um povo santo e pecador. Que o Deus da vida nos ressuscite para uma vida nova, que consiste na adesão livre e consciente do projeto de Jesus: vida plena para todos, mesa farta, comunhão e participação.

Tiago de França da Silva
Seminarista da Congregação da Missão e estudante de Filosofia no ITEP
missionariotiago@hotmail.com

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