Quando ainda estava
com seus discípulos, Jesus quis saber o que se passava na cabeça deles. Certa
vez, perguntou-lhes sobre o que pensavam a seu respeito. A resposta de Pedro,
um dos discípulos, foi imediata e reveladora: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo” (Mt 16, 16). Jesus afirmou
que esta resposta de Pedro foi uma revelação de Deus Pai. Todo aquele que segue
Jesus hoje, deve responder à pergunta sobre quem é Jesus.
Não nos
parece razoável seguir a um desconhecido. O evangelho nos fala do necessário
encontro com Jesus, para conhecê-lo de perto. Para conhecer uma pessoa é
preciso aproximar-se dela. A partir da experiência de Jesus, e considerando a
realidade religiosa do cristianismo de nossos dias, refletiremos sobre esta
necessária aproximação: Aproximar-se para conhecer e permanecer com Jesus.
Na comunidade cristã, as pessoas escutam
falar de Jesus, mas, muitas vezes, não se encontram com ele. É verdade que a
comunidade cristã é um dos lugares de encontro com ele. Toda comunidade cristã
deveria revelar a presença de Jesus. Infelizmente, há casos nos quais isto não
ocorre. Há comunidades que revelam de tudo, menos a presença dele. Nelas
encontramos o julgamento, a condenação e as exclusão de pessoas. Na história da
Igreja há pessoas que revelaram o significado da filiação divina de Jesus.
Crer em Jesus como Filho do Deus vivo
não é somente professar o credo apostólico na liturgia dominical. É muito fácil
crer com os lábios. Oferecer hinos de louvor ao Deus vivo é, certamente, atitude
inerente ao crente que professa a fé na comunidade cristã. A liturgia celebra o
amor vivido pelos que creem no Deus vivo. Por isso, os que creem precisam, em
primeiro lugar, viver o amor. Quem vive no amor, de fato, já celebra a
verdadeira liturgia, e proclama, com o testemunho da própria vida, que Jesus é
o Filho do Deus vivo.
Vale a pena lembrar o testemunho de dois
bispos, que marcaram a história da Igreja Católica no Brasil: Dom Helder Câmara
e Dom Luciano Mendes de Almeida. Neste domingo, 27 de agosto, celebra-se a
memória de ambos, pois o primeiro faleceu em 27 de agosto de 1999, e o segundo
em 27 de agosto de 2006. Estes bispos possuem muitas coisas em comum, sendo a
opção pelos pobres a mais importante. Eles se encontraram com Jesus na pessoa dos
pobres. Não foram bispos convencionais, como tantos outros, mas foram profetas
do Reino de Deus.
Dom Helder era poeta, místico e profeta.
Cearense de nascimento, tornou-se conhecido pela sua ação pastoral junto aos
pobres, pela sua denúncia firme das injustiças, e pelo seu jeito humilde e
alegre de ser. Era homem da palavra e do gesto, como todo profeta. Fiel a
Jesus, cultivou uma profunda intimidade com o Filho do Deus vivo. Homem de
oração, era um contemplativo na ação. Com outros, viveu radicalmente a opção de
Jesus. Amado pelos pobres e odiado por muitos ricos, denunciou com firmeza e
ousadia os crimes cometidos pela ditadura militar no Brasil. Foi escutado e
aplaudido no Brasil e no exterior. Também no seio da Igreja era odiado, tanto
por leigos quanto por padres e bispos coniventes com a ditadura. Também o papa
João Paulo II não gostava da sua atuação, pois reclamava das viagens do “bispo
vermelho” ao exterior, principalmente à Europa. O papa sofria do mal da inveja,
assim como tantos outros clérigos da Igreja.
Dom Luciano era jesuíta, homem dos
pobres e místico. Dotado de rara inteligência, mas revestido de grande
humildade. Não aparentava ser doutor. Homem de gestos e palavras profundamente
marcadas pela profecia, tornou-se um dos bispos mais importantes da história da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, da qual foi secretário-geral e
presidente. Profundo conhecedor, defensor e promotor dos direitos humanos,
trabalhou, incansavelmente, pela promoção da dignidade da pessoa humana,
especialmente dos mais pobres. Em Mariana – MG, como Arcebispo, manifestou a
bondade divina como pastor zeloso junto aos pobres. Morreu com fama de
santidade, e seu processo de beatificação foi instaurado em 27 de agosto de
2014.
Dom Helder e Dom Luciano jamais podem
ser esquecidos. Hoje, mais do que em outras épocas, a Igreja Católica no Brasil
precisa reler a biografia destes dois santos. Eles compreenderam e anunciaram a
mensagem de Jesus. Foram missionários do evangelho da caridade, da verdade e da
liberdade. Ambos nos indicam o caminho de Jesus, caminho de profecia: anúncio
da Boa Notícia do Reino e denúncia dos crimes contra a vida do povo de Deus.
Todo o povo de Deus, principalmente os líderes religiosos, precisam aprender
com estes santos, a aderir à proposta de Jesus: o Reino de Deus.
Hoje, Dom Helder e Dom Luciano nos
ensinam a denunciar o que está acontecendo no Brasil. O País está sendo
governado por uma organização criminosa, que faz o que quer, sem ser
devidamente punida na forma da lei. Muitos criminosos não estão sendo punidos,
apesar de seus crimes serem de conhecimento público. O governo federal não é
governo, mas desgoverno. Todas as medidas tomadas são contrárias ao bem comum
e, portanto, violam os direitos e garantias fundamentais. A reforma trabalhista,
que já é lei, bem como a previdenciária e tributária, que estão por vir,
atentam contra a dignidade de todos os brasileiros.
Recentemente,
o desgoverno anunciou a realização de dezenas de privatizações, a extinção de
uma reserva ambiental de milhões de hectares de terra, e tantas outras medidas
que estão em curso, demonstram, claramente, que o Brasil está sendo,
gravemente, violentado. Neste sentido, a Igreja precisa posicionar-se aberta e
profeticamente, assim como Dom Helder e Dom Luciano se pronunciaram, quando
exerceram, com ousadia profética, a missão de pastores do povo santo de Deus.
O povo
está sendo violentado, e os pastores precisam erguer a voz. Não pode a Igreja
ser omissa, pois “As alegrias e as
esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos
pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças,
as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma
verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração” (Constituição
Pastoral Gaudium et Spes, n. 01).
Hoje, assiste-se no Brasil a muita angústia, tristeza e sofrimento, provocados
por quem explora, impiedosamente, o povo.
Os
pobres e todos aqueles que sofrem precisam da voz profética da Igreja, a fim de
que tais abusos e crimes sejam, incansavelmente, denunciados. A Igreja precisa
proclamar a verdade sobre os telhados, para que o povo não seja enganado por
aqueles que mentem e se utilizam de todos os meios possíveis para sustentar
suas mentiras. Que o testemunho profético e missionário de Dom Luciano e Dom
Helder nos inspire e nos desperte para o conhecimento da verdade, a prática da
caridade e da liberdade. Assim como eles, não podemos calar. A profecia não
pode cair. O Espírito de Jesus nos impele a falar e lutar. A esperança dos
pobres vive!
Tiago
de França
3 comentários:
Parabéns Tiago França, por sua visão e forma de expor um assunto tão pertinente como o que está se passando em nosso país. Este,por sua vez entrelaçado na história de dois grandes homens que há época buscou a defesa dos menos favorecidos, Acredito que estes também sofreram perseguições assim como Jesus Cristo com sua passagem em defesa do povo que sofria.
Sempre acompanhado seus posts!
Parabéns meu grande amigo.
Obrigado, amigos, pela apreciação do texto!
Abraço fraterno,
Tiago de França
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