sábado, 6 de julho de 2019

O Cristo rejeitado: Jo 7,1-24. Homilia breve.

Irmãos e irmãs,

            O trecho do Evangelho que acabamos de ouvir se localiza após o discurso de Jesus sobre o pão da vida. Trata-se da presença de Jesus na Festa das Tendas, em Jerusalém. Esta festa era uma das três grandes peregrinações do ano judaico, e contava com a presença numerosa multidão de judeus, que, fervorosamente, agradeciam a Deus pelo bom êxito das colheitas e suplicavam boas colheitas para o ano vindouro.

            O texto traz muitos elementos que certamente merecem a nossa atenção e meditação, mas no contexto desta homilia, quero ressaltar alguns aspectos da subida de Jesus a Jerusalém para participar desta importante festa.

            O texto se inicia dizendo que os judeus queriam matar Jesus. Esta não foi a primeira vez que isto aconteceu. No Evangelho de João encontramos um constante conflito entre Jesus e as autoridades judaicas do seu tempo. Qual será a motivação deste conflito? O texto nos responde. Os chefes dos judeus viam em Jesus uma ameaça que precisava ser eliminada.

            Em seguida, o texto fala dos irmãos de Jesus. Estes irmãos são os membros de sua família. Aqui não queremos entrar na discussão sobre se eram irmãos de sangue de Jesus ou não. Mas desejamos explicitar a recomendação deles: “Parte daqui e vai para a Judeia, para que teus discípulos também vejam as obras que fazes, pois ninguém age às ocultas, quando quer ser publicamente conhecido. Já que fazeis tais coisas, manifesta-te ao mundo!”

            Estas palavras dos parentes de Jesus mostram que queriam publicidade. Eles esperavam uma manifestação pública de forma espetacular. Esse desejo decorre daquilo que se tinha em mente naquela época: a promessa da vinda do Messias. Este era esperado de forma espetacular. Eles queriam que Jesus liderasse um movimento de libertação política, pois o clima era de revolta na Galileia e em Jerusalém, coração do mundo judeu. Mas Jesus não foi enviado com esta missão.

            Tendo alertado aos seus sobre o tempo oportuno para a sua manifestação pública em Jerusalém, Jesus fala do ódio do mundo em relação à sua pessoa. Por que o mundo o odiava? Porque ele dava testemunho de que as obras do mundo eram más. Já no início do Evangelho encontramos este mesmo sentido para a palavra mundo: o mundo que não reconheceu o Verbo de Deus (1,10). Jesus expõe as trevas do mundo. Aqui temos a razão da hostilidade do mundo em relação a Jesus. Quem não acredita em Jesus não experimenta a hostilidade do mundo.

            Tendo chegado o tempo oportuno, Jesus, às ocultas, sobe para a festa. Seus irmãos também subiram. Na festa, os judeus do Sinédrio procuravam prendê-lo, e as multidões tinham medo deles, porque não aceitavam que se falasse publicamente de Jesus. Falar de Jesus publicamente era algo bastante perigoso. Por isso, ao pé do ouvido, a gente do povo falava sobre Jesus: uns achavam que ele era um homem bom; outros diziam que ele era um enganador do povo.

            No meio da festa, Jesus subiu ao Templo e, ensinando, causou admiração em todos. Ele tinha o conhecimento das Escrituras e sabia convencer o povo. Hoje podemos dizer que Jesus tinha, entre outros dons, o da palavra. Os judeus o questionavam pelo conteúdo da sua palavra, que os incomodava.

            Respondendo ao questionamento dos presentes, Jesus fala da sua doutrina. Aliás, a doutrina não era sua, mas do seu Pai. Quem cumpre a vontade do Pai reconhece que a doutrina pertence a Deus Pai. Citando Moisés, que deu a Lei aos judeus, Jesus acusa aqueles que não praticam a Lei. Ele questiona o motivo da pretensão dos judeus em querer matá-lo.

            E o texto escolhido para esta meditação chega ao seu fim com o esclarecimento de Jesus a respeito da obra de Deus realizada em sua pessoa. Referindo-se à cura do enfermo da piscina de Betesda (cf. Jo 5, 1-18), Jesus denuncia o legalismo judaico que proibia salvar uma vida em dia de sábado. Ele exige que o julgamento dos fatos não seja feito levando-se em conta as aparências, mas conforme a justiça. Este, meus irmãos e irmãs, é o texto que acabamos de ouvir.

            Gostaria de frisar três pontos fundamentais para a nossa reflexão pessoal e comunitária. A palavra de Deus fala à nossa vida. A nossa conversão parte da escuta amorosa desta palavra.

            O primeiro ponto se refere à maneira como enxergamos Jesus. Hoje, cremos e professamos que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. O que isto significa para nós? Que tipo de Messias temos em nossa mente? Será que somos como os judeus, que esperavam um Messias glorioso, com poder político para resolver conflitos? O que pensamos a respeito de Jesus, meus irmãos e irmãs, diz muito da nossa fé. Por trás de muitas manifestações externas de fé, encontramos muitas imagens falsas de Jesus.

            Em João, o Messias é o enviado do Pai, que veio ao mundo para nos ensinar a caminho do amor, caminho que conduz à vida plena. O amor se manifesta a partir da nossa fraqueza. Por isso, irmãos e irmãs, não tenhamos medo de aceitar a doutrina do Pai, anunciada e vivida por Jesus, que consiste no amor sem limites, que nos faz irmãos uns dos outros.

            O segundo ponto que aparece no texto evangélico é o da rejeição à pessoa de Jesus. Muitos não acreditaram nele, inclusive os de sua família. A vida plena, meus irmãos e irmãs, depende do acreditar. Quem não crê não tem a vida. Já está morto. Rejeita Jesus todo aquele que não acredita nele. E nós, cremos em Jesus, com palavras e ações, ou optamos por rejeitá-lo em nossos irmãos e irmãs? Tomemos cuidado, irmãos e irmãs, com o pecado da indiferença. Tratar os outros com indiferença é uma forma de rejeição a Jesus.

            Por fim, um terceiro ponto: a nossa forma de julgar os fatos e as pessoas. Não fomos constituídos juízes da vida alheia. Mas estamos a todo momento julgando, e o fazemos, muitas vezes, baseando-nos na aparência. Irmãos e irmãs, o nosso juízo, diz Jesus, deve ser conforme a justiça. Até que ponto somos justos com as pessoas, no trato que temos com elas, e em nossas falas a seu respeito?

            Peçamos ao bom Deus, que em nossas relações com as pessoas, sejamos amorosos para enxergamos Jesus nos outros. O Messias não está nas alturas dos céus, mas em nosso meio, diuturnamente. Que o Espírito nos conceda o dom da acolhida dos outros, que são diferentes e nos interpelam. A rejeição não pertence à fé cristã.

           A fé cristã abre-nos para os outros, para servi-los no amor, desinteressadamente. E se tivermos de emitir um juízo sobre alguém, que possamos considerar os outros como irmãos no amor. A nossa atitude deve ser a de Jesus, que em tudo procurou fazer a vontade do Pai e, por isso, foi glorificado. Ele nos chama para participarmos desta mesma glória, porque somos seus amigos, e nele, somos filhos de Deus. 

Tiago de França

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