No seio
de inúmeras Igrejas cristãs, muitas pessoas têm dito que não se vacinarão
contra a Covid-19. Muitas são as fake
news que circulam nas redes sociais, levando muita gente desinformada a
crer que a vacina é um mal, não um bem à saúde humana. A desinformação causa
tanto mal quanto o novo coronavírus.
Pessoas desinformadas acreditam nas
várias mentiras que se falam sobre a vacina, oriunda de vários laboratórios
renomados. Dentre as mentiras se destacam as seguintes: afirmam que ela contém o
vírus HIV; que causa paralisia em todo o corpo; que transforma a pessoa em um
jacaré; que transforma a pessoa em homossexual; que causa impotência sexual;
que faz cair o cabelo; que causa cegueira; que provoca alergia e problemas
cardíacos; que é usada pelo governo para matar, em primeiro lugar, os
aposentados; que a vacina chinesa é a mais perigosa, porque a China é comunista
(a vacina chinesa contém o vírus do comunismo!) etc. Muitos outros absurdos
sobre a vacina circulam nas redes sociais.
É conhecida a posição do presidente
da República, que nega a eficácia da vacina, principalmente a chinesa, e que já
afirmou que não irá se vacinar. É algo inédito na história da República
brasileira, porque nunca tivemos um presidente que tenha sido contrário a
nenhum tipo de vacina. Essa posição do presidente também influencia muitos desinformados.
É claro que qualquer pessoa, incluindo o presidente, pode se negar a se
vacinar. O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a vacinação contra a
Covid-19 deve ser obrigatória, mas nenhum cidadão será forçado a se vacinar.
Em tempos sombrios, marcados pelo
obscurantismo, é preciso afirmar o óbvio: a finalidade da uma vacina não é
provocar doenças, mas preveni-las. Desde a infância, todo brasileiro recebe
inúmeras vacinas. Nunca houve um movimento tão forte, contrário à vacinação. Se
o presidente da República fosse favorável à vacinação, e tivesse se empenhado
para que a mesma se efetivasse da forma mais ágil e organizada possível, como
ocorre em vários países do mundo, principalmente na Europa, certamente, no
Brasil, a confusão em torno da vacina não existiria.
O problema é que o presidente e o
governador de São Paulo transformaram a vacinação numa questão política,
visando as eleições de 2022. Como o governador aderiu à vacina chinesa, o
presidente passou a se opor, principalmente, à “vacina comunista”. Essa situação
é vergonhosa e lamentável, porque leva a crer que tanto o presidente quanto o
governador não estão preocupados, em primeiro lugar, com a saúde das pessoas,
mas se utilizam da vacina para se promover no cenário político nacional. Uma
das evidências disso é o pedido que o governador fez ao país comunista, para
que a vacina, no Brasil, seja denominada “vacina do Brasil”.
Ninguém precisa ser oposição
política ao presidente para constatar essa realidade. Não é novidade para
ninguém que o presidente adota o negacionismo em questões científicas. Para o
presidente e seus seguidores/admiradores, a palavra da ciência não tem muito
valor. A existência da pandemia, a periculosidade do novo coronavírus, a
produção e eficácia da vacina são evidências científicas. Contra tais
evidências, o senso comum não tem nenhuma força, porque são realidades
devidamente estudadas e comprovadas. O bom senso exige o reconhecimento daquilo
que a ciência consegue comprovar, pois graças a esta a Covid-19 poderá ser controlada
e erradicada.
O que a fé em Jesus tem a dizer
sobre a ciência e a confusão gerada pelo negacionismo? A Igreja Católica não se
opõe à ciência; pelo contrário, inúmeros sacerdotes e leigos se dedicaram às
pesquisas científicas. A história da Igreja comprova isso. Há um diálogo possível
e fecundo entre fé e ciência, porque são realidades que não se excluem. Recentemente,
a Congregação para a Doutrina da Fé manifestou-se por escrito, reconhecendo a
possibilidade de se receber vacinas contra a Covid-19 que utilizem as linhagens
celulares de fetos abortados na sua pesquisa e processo de produção.
Considerando que a Igreja prega o
Evangelho de Jesus Cristo, cujo núcleo fundamental é a promoção e defesa da
vida e da dignidade da pessoa humana, o Papa Francisco recordou a necessidade
de as vacinas serem acessíveis para todos, especialmente aos mais pobres e
vulneráveis. Na audiência do dia 19 de agosto deste ano, disse o Papa: “Seria
triste se a prioridade da vacina contra a Covid-19 fosse dada aos mais ricos. Seria
triste se isso se transformasse na prioridade de uma nação e não fosse
destinado a todos”. No início de 2021, toda a população do Estado do Vaticano
será vacinada, incluindo, obviamente, o próprio Papa Francisco.
A fé em Jesus não impede que uma
pessoa seja vacinada. Afirmar o contrário seria um absurdo. Portanto, um
cristão afirmar que não pode ser vacinado por causa da sua fé em Jesus, é algo
sem sentido. Também é reprovável a atitude de todo e qualquer líder religioso
que induz as pessoas a não se vacinarem. Tal atitude é passível de verificação
criminal, porque coloca a vida das pessoas em risco. É gravemente ilícita a atitude
de quem, disseminando mentiras, induz as pessoas a não se vacinarem. Quando um
líder religioso se atreve a isso, também incorre em pecado grave. O cristão deve
aderir à verdade, não à mentira, principalmente quando esta coloca em risco a
vida das pessoas.
Outra atitude reprovável ao cristão
é não se vacinar pensando que, uma vez se contaminando, Jesus certamente
realizará a cura da Covid-19. Jesus tem poder para curar uma pessoa? Claro que
sim! Mas isso é justificativa para recusar a vacina? Claro que não! Os pais
podem, em nome da fé em Jesus, deixar de vacinar seus filhos? De modo algum!
Confiando na fé que tem em Jesus, pode o cristão se expor ao mal? Quando o
diabo pediu para Jesus se lançar no precipício, argumentando que Deus enviaria
seus anjos para protegê-lo, eis o que o Mestre respondeu: “Também está escrito: Não porás a prova o Senhor teu Deus” (Mt
4,7).
Milhares de cristãos já morreram por
Covid-19 em todo o mundo. Muitos eram ministros ordenados, homens ungidos por
Deus para o apostolado na Igreja e no mundo. Por que a fé dessas pessoas não as
livrou da morte? Os teimosos podem argumentar que a fé dessas pessoas não era
suficientemente grande! Esse tipo de julgamento não convém fazer. Somente Deus
pode julgar a fé das pessoas, porque somente Ele conhece o coração humano. Muitos
desses teimosos hoje estão sepultados, porque não se preveniram: pensavam que a
Covid-19 seria incapaz de tirar-lhes a vida.
A fé cristã rima com bom senso,
prevenção e cuidado. A vida humana é frágil e exige cuidado permanente. Toda pessoa
precisa cuidar da saúde física e mental. A fé em Jesus não dispensa, nem
substitui esse cuidado. Cuidar-se é ser responsável por si mesmo e pelos
outros. Essa responsabilidade não pode ser transferida para Deus. O Senhor
dotou o homem de inteligência, sensibilidade e disposição para a promoção e
defesa da vida humana.
A
vacina contra Covid-19 é fruto da inteligência humana, capaz de encontrar
solução para os problemas que afligem toda a humanidade. Neste momento da
história, crer e vacinar-se são imprescindíveis para a preservação da vida. A vida
está em primeiro lugar. Toda crença que fere e ameaça a vida é incompatível com
a mensagem do Evangelho de Jesus. Deus acredita no homem, e este deve aprender
a confiar na capacidade que tem para colaborar com a ação salvífica de Deus.
Tiago
de França
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