“A Palavra se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14)
Anualmente, celebra-se a solenidade
do Natal do Senhor. Para aqueles que não vivem em comunhão com o mistério de
Cristo, 25 de dezembro é feriado, dia de muita comida e bebida, e de trocar
presentes. O mercado ofuscou o verdadeiro brilho do Natal. Apesar da pandemia
do novo coronavírus, milhões de pessoas continuam enxergando o Natal como uma
excelente oportunidade para comprar e vender. E assim acontece, anualmente.
Entre os católicos, há os que
raramente participam da liturgia da Igreja. Mas costumam aparecer para
participarem da Missa de Natal. Muitos retornam na Missa de vésperas de Ano
Novo, ou na do dia 1º de janeiro. Trata-se de um jeito esporádico de ser
católico. Há uma consciência maior sobre o sentido do Natal entre os que
celebram o mistério pascal de Cristo durante todo o ano litúrgico. Estes sabem
que não se celebra o aniversário de Jesus, mas o mistério da Encarnação da
Palavra, Jesus, o Messias.
Jesus é a Palavra de Deus, que
estava com Deus desde toda a eternidade; é a vida dos homens, luz que brilha
nas trevas (cf. Jo 1,4-5). Em Cristo Jesus, temos a encarnação do próprio Deus,
que veio armar sua tenda no meio do mundo. Não veio a passeio, mas para
permanecer. Ele é o Emanuel, Deus
conosco (cf. Mt 1,23). A vinda de Jesus é a prova incontestável do amor de
Deus, que jamais abandona o seu povo. O Messias foi enviado para oferecer a
salvação a toda a humanidade. Ele é a expressão viva do desejo de Deus:
libertar o ser humano do pecado e do poder da morte, fazendo surgir uma
humanidade nova. O Messias inaugura a nova e eterna Aliança.
Jesus, Palavra de Deus, armou a sua
tenda no meio dos pobres (cf. Lc 2,6-7). Nasceu pobre não por acaso, mas porque
desde os tempos de Abraão, Deus escolheu um povo frágil e pobre. Do Gênesis ao
Apocalipse, as Escrituras falam da predileção divina pelos pobres. Deus ama
toda a humanidade, mas seu amor se dirige especialmente aos pobres e
sofredores. Estes são mais vulneráveis e, por isso mesmo, carecem de mais
atenção e cuidado. A pobreza do Messias é a riqueza de todo o povo de Deus.
Contemplando o Messias na manjedoura, os pobres e sofredores compreendem o
sentido do Natal. No presépio natalino, o Senhor nos diz: “Eis o Messias, vosso
Salvador. Ele veio para vós”.
Jesus nasce hoje entre os pobres e
sofredores de todos os povos e nações. No Brasil, Ele permanece e sofre na vida
dos mais de 14 milhões de desempregados; dos familiares das vítimas da
Covid-19; dos que se encontram internados nos hospitais e os que estão
desenganados pelos médicos; dos familiares das vítimas da violência,
principalmente as vítimas de policiais criminosos; das crianças e idosos
explorados; dos que estão doentes, psicologicamente, sofrendo com depressão,
ansiedade, síndromes e traumas; dos injustiçados, vítimas da arbitrariedades
dos poderosos (empresários, juízes, políticos, patrões desonestos etc.); dos
que são explorados por líderes religiosos mercenários etc. Todos esses e tantos
outros sofredores pertencem à tenda do Senhor. Todos estão sob o olhar
misericordioso e amoroso de Deus. Ai daqueles que ferem a dignidade desses
filhos e filhas de Deus!
A Igreja tem consciência de que não
pode celebrar o Natal de Jesus ignorando os pobres e sofredores. A liturgia
solene do Natal nos fala de encarnação, ou seja, da participação na carne de
Cristo, e de Cristo na carne humana. Os pobres e sofredores são a carne de
Jesus Cristo. Sem comunhão com a carne de Cristo não há Natal, mas aparência de
Natal. Essa comunhão vai além das cestas de Natal dadas aos pobres, que também
são importantes, pois muitos passam fome. Esta exige alimento, imediatamente.
Mas também exige geração de emprego e renda. A comunhão com a carne sofrida de
Jesus não é experiência desligada do necessário encontro com os pobres. Não se
adora a carne sofrida de Jesus somente na adoração eucarística, mas, sobretudo,
nas feridas abertas dos que sofrem.
O Espírito do Senhor, que fecundou o
ventre da Virgem Maria, torna o cristão capaz de viver em comunhão com a carne
sofrida de Jesus, o Messias. Esse mesmo Espírito liberta da indiferença, do
obscurantismo e da desunião. A celebração da encarnação da Palavra deve levar o
cristão a despertar para a construção de um mundo novo, no qual a justiça do
Reino de Deus ocupe lugar central. Sem essa justiça, a paz não é possível. Que
o Natal de Jesus desperte o coração de todo cristão para o compromisso com essa
justiça, que exige o feliz encontro com os sofredores deste mundo!
Feliz Natal!
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