“Quem
quiser viver na perfeição, nada mais tem a fazer do que desprezar aquilo que
Cristo desprezou na cruz e desejar o que ele desejou. Na cruz, pois, não falta
nenhum exemplo de virtude” (Das Conferências de Santo Tomás de
Aquino, presbítero, séc. XIII).
Nascido por volta do ano 1225, de
família rica, santo Tomás era dominicano e completou seus estudos em Paris e em
Colônia. Foi aluno de santo Alberto Magno, escreveu muitas obras, e como
professor, lecionou disciplinas filosóficas e teológicas. Tornou-se muito
famoso, e até hoje é considerado um dos maiores teólogos da história da Igreja.
Morreu a 7 de março de 1274. Na liturgia da Igreja católica, sua memória é
celebrada a 28 de janeiro, data em que seu corpo foi trasladado para Toulouse,
na França, em 1369.
Os escritos de santo Tomás revelam
um mestre da especulação teológica, alguém com capacidade intelectual
suficiente para mergulhar na ciência das coisas divinas. O conhecimento
sistemático da Teologia não é para todo mundo, pois nem todos tem capacidade
para mergulhar na complexidade desta importante ciência. O fato de nem todos
terem capacidade para dominar os conceitos e realidades teológicas não
significa que sejam inferiores aos graduados, mestres e doutores em Teologia.
É verdade que o conhecimento teológico não se
reduz somente à especulação e/ou à pesquisa, mas também envolve a fé e,
consequentemente, a relação com Deus na vida eclesial. Portanto, o teólogo é
alguém que não somente realiza leituras, pesquisas e interpretações, mas por
meio destas atividades se relaciona com Deus e oferece às pessoas o resultado
do seu trabalho. A Teologia envolve toda a vida do teólogo, transformando-o em
um instrumento nas mãos daquele que está no centro do fazer teológico, ou seja,
aquele que é o “objeto” por excelência do trabalho teológico: Deus.
Santo Tomás fez parte do valioso
grupo daqueles que trabalharam intensamente para o esclarecimento da fé cristã.
Exemplo disso é a sua Suma Teológica, escrita com o objetivo de apresentar,
sistematicamente, a doutrina sagrada aos homens e mulheres de boa vontade. O arcabouço
teológico de santo Tomás é de grande valia para a compreensão justa e
necessária da fé, bem como integra a tradição da Igreja, naquilo que há de mais
belo e profundo. Este “Doutor Angélico” era homem contemplativo, silencioso e
discreto; de poucas palavras, apelidado “boi mudo”, tinha como preocupação
fundamental oferecer aos outros os frutos da contemplação.
Em todas as épocas e lugares, sempre
nasceram mulheres e homens dotados de uma capacidade especial para compreender,
assimilar, analisar e transmitir inúmeros tipos de conhecimentos. Trata-se de
um dom, de um chamado à vida intelectual. Também na história da Igreja,
encontramos pessoas de grande envergadura, constituídas de uma enorme
capacidade de abstração e domínio do conhecimento. São pessoas que precisam ser
identificadas, reconhecidas e direcionadas para maiores aperfeiçoamentos. Quem tem
vocação à vida intelectual precisa de oportunidades para realizar a sua
vocação.
A vocação à vida intelectual a
serviço do anúncio do Evangelho é essencial para a vida da Igreja. O que seria
da Igreja se não fossem os grandes mestres da fé, como os Santos Padres da era
patrística e tantos outros doutores e doutoras de épocas posteriores? O
Vaticano II, responsável pela grande guinada da Igreja na segunda metade do
século XX, foi precedido pelo trabalho de teólogos de grande peso, que deixaram
obras memoráveis para serem lidas e relidas. O que seria da Igreja sem a
contribuição de homens como Karl Rahner, Yves Congar, Hans Küng, Hans Urs von
Balthasar, Jean Daniélou, Joseph Ratzinger, Joseph Comblin, Johann Baptist
Metz, Bernard Häring, João Batista Libânio, Leonardo Boff, Ivone Gebara,
Clodovis Boff, Jon Sobrino, Gustavo Gutiérrez, entre outros?
Certamente, não nasceram teólogos,
mas a Igreja os fez pensadores da ciência das coisas divinas. Eles tiveram a
oportunidade para estudar bastante, tiveram tempo e espaço para pensar a fé em
Jesus Cristo. Esta fé possui conteúdo, história e razão de ser. Santo Tomás
ajudou a Igreja a dar ao mundo as razões da fé que professa, e nos deixou a
sagrada provocação de continuar pensando a fé a partir de Cristo em plena sintonia
com a realidade atual. A Igreja de hoje precisa de mulheres e homens que se
dediquem a este trabalho. O Espírito do Senhor, força que guia a Igreja em seu
peregrinar rumo ao Reino definitivo, nunca deixou faltar estas mentes inquietas,
sedentas do conhecimento de Deus.
O Papa Bento XVI, em uma de suas
catequeses sobre santo Tomás, recordou que certa vez, enquanto rezava na capela
de São Nicolau, em Nápolis, o sacristão Domingos de Caserta ouviu o diálogo do
santo com Deus. Preocupado se sua teologia era, de fato, de acordo com a
vontade de Deus, santo Tomás ouve uma voz sair do crucifixo: “Falaste bem de mim, Tomás, qual será tua
recompensa?” E o Doutor Angélico respondeu: “Nada mais do que Tu, Senhor”.
A
Trindade é a recompensa do árduo e sagrado trabalho do teólogo. Mais que em
outras épocas da história, para não sofrer do mal da mediocridade, que também
deriva do enfraquecimento da fé, a Igreja precisa investir naqueles que receberam
do Espírito do Senhor o chamado para mergulhar nas águas mais profundas do
conhecimento de Deus. Para desprezar o que Cristo desprezou na cruz e desejar o
que ele desejou, este conhecimento de Deus é essencial, pois sem ele parece não
ser possível saber e sentir os apelos de Deus para o hoje da história. É preciso
conhecer e meditar, contemplar e sentir, amar e ser amado. A Teologia contempla
tudo isso.
Tiago de França
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