terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Santo Tomás de Aquino e o esclarecimento da fé


“Quem quiser viver na perfeição, nada mais tem a fazer do que desprezar aquilo que Cristo desprezou na cruz e desejar o que ele desejou. Na cruz, pois, não falta nenhum exemplo de virtude” (Das Conferências de Santo Tomás de Aquino, presbítero, séc. XIII).
            Nascido por volta do ano 1225, de família rica, santo Tomás era dominicano e completou seus estudos em Paris e em Colônia. Foi aluno de santo Alberto Magno, escreveu muitas obras, e como professor, lecionou disciplinas filosóficas e teológicas. Tornou-se muito famoso, e até hoje é considerado um dos maiores teólogos da história da Igreja. Morreu a 7 de março de 1274. Na liturgia da Igreja católica, sua memória é celebrada a 28 de janeiro, data em que seu corpo foi trasladado para Toulouse, na França, em 1369.
            Os escritos de santo Tomás revelam um mestre da especulação teológica, alguém com capacidade intelectual suficiente para mergulhar na ciência das coisas divinas. O conhecimento sistemático da Teologia não é para todo mundo, pois nem todos tem capacidade para mergulhar na complexidade desta importante ciência. O fato de nem todos terem capacidade para dominar os conceitos e realidades teológicas não significa que sejam inferiores aos graduados, mestres e doutores em Teologia.
             É verdade que o conhecimento teológico não se reduz somente à especulação e/ou à pesquisa, mas também envolve a fé e, consequentemente, a relação com Deus na vida eclesial. Portanto, o teólogo é alguém que não somente realiza leituras, pesquisas e interpretações, mas por meio destas atividades se relaciona com Deus e oferece às pessoas o resultado do seu trabalho. A Teologia envolve toda a vida do teólogo, transformando-o em um instrumento nas mãos daquele que está no centro do fazer teológico, ou seja, aquele que é o “objeto” por excelência do trabalho teológico: Deus.
            Santo Tomás fez parte do valioso grupo daqueles que trabalharam intensamente para o esclarecimento da fé cristã. Exemplo disso é a sua Suma Teológica, escrita com o objetivo de apresentar, sistematicamente, a doutrina sagrada aos homens e mulheres de boa vontade. O arcabouço teológico de santo Tomás é de grande valia para a compreensão justa e necessária da fé, bem como integra a tradição da Igreja, naquilo que há de mais belo e profundo. Este “Doutor Angélico” era homem contemplativo, silencioso e discreto; de poucas palavras, apelidado “boi mudo”, tinha como preocupação fundamental oferecer aos outros os frutos da contemplação.
            Em todas as épocas e lugares, sempre nasceram mulheres e homens dotados de uma capacidade especial para compreender, assimilar, analisar e transmitir inúmeros tipos de conhecimentos. Trata-se de um dom, de um chamado à vida intelectual. Também na história da Igreja, encontramos pessoas de grande envergadura, constituídas de uma enorme capacidade de abstração e domínio do conhecimento. São pessoas que precisam ser identificadas, reconhecidas e direcionadas para maiores aperfeiçoamentos. Quem tem vocação à vida intelectual precisa de oportunidades para realizar a sua vocação.
            A vocação à vida intelectual a serviço do anúncio do Evangelho é essencial para a vida da Igreja. O que seria da Igreja se não fossem os grandes mestres da fé, como os Santos Padres da era patrística e tantos outros doutores e doutoras de épocas posteriores? O Vaticano II, responsável pela grande guinada da Igreja na segunda metade do século XX, foi precedido pelo trabalho de teólogos de grande peso, que deixaram obras memoráveis para serem lidas e relidas. O que seria da Igreja sem a contribuição de homens como Karl Rahner, Yves Congar, Hans Küng, Hans Urs von Balthasar, Jean Daniélou, Joseph Ratzinger, Joseph Comblin, Johann Baptist Metz, Bernard Häring, João Batista Libânio, Leonardo Boff, Ivone Gebara, Clodovis Boff, Jon Sobrino, Gustavo Gutiérrez, entre outros?
            Certamente, não nasceram teólogos, mas a Igreja os fez pensadores da ciência das coisas divinas. Eles tiveram a oportunidade para estudar bastante, tiveram tempo e espaço para pensar a fé em Jesus Cristo. Esta fé possui conteúdo, história e razão de ser. Santo Tomás ajudou a Igreja a dar ao mundo as razões da fé que professa, e nos deixou a sagrada provocação de continuar pensando a fé a partir de Cristo em plena sintonia com a realidade atual. A Igreja de hoje precisa de mulheres e homens que se dediquem a este trabalho. O Espírito do Senhor, força que guia a Igreja em seu peregrinar rumo ao Reino definitivo, nunca deixou faltar estas mentes inquietas, sedentas do conhecimento de Deus.
            O Papa Bento XVI, em uma de suas catequeses sobre santo Tomás, recordou que certa vez, enquanto rezava na capela de São Nicolau, em Nápolis, o sacristão Domingos de Caserta ouviu o diálogo do santo com Deus. Preocupado se sua teologia era, de fato, de acordo com a vontade de Deus, santo Tomás ouve uma voz sair do crucifixo: “Falaste bem de mim, Tomás, qual será tua recompensa?” E o Doutor Angélico respondeu: “Nada mais do que Tu, Senhor”.
A Trindade é a recompensa do árduo e sagrado trabalho do teólogo. Mais que em outras épocas da história, para não sofrer do mal da mediocridade, que também deriva do enfraquecimento da fé, a Igreja precisa investir naqueles que receberam do Espírito do Senhor o chamado para mergulhar nas águas mais profundas do conhecimento de Deus. Para desprezar o que Cristo desprezou na cruz e desejar o que ele desejou, este conhecimento de Deus é essencial, pois sem ele parece não ser possível saber e sentir os apelos de Deus para o hoje da história. É preciso conhecer e meditar, contemplar e sentir, amar e ser amado. A Teologia contempla tudo isso.

Tiago de França

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