sexta-feira, 30 de agosto de 2019

O mal da mediocridade intelectual


         Precisamos falar deste tema. O que seria uma pessoa que sofre do mal da mediocridade intelectual? Vamos pensar um pouco. Este convite já nos mostra uma primeira característica de uma pessoa que sofre deste mal: ausência do pensar. Quem não pensa, não evolui, e quem não evolui padece na mediocridade. Certamente, quem sofre deste mal, também padece de outro: o da vida medíocre.

Mas queremos nos deter sobre a mediocridade que afeta o cérebro humano. Isto mesmo. Queremos falar daquela situação que nos assusta, a saber: olhar para uma pessoa que não se concebe pessoa, portadora de uma capacidade de crescimento humano e intelectual. Toda pessoa tem este potencial, mas o medíocre não liga para a maravilha que é a capacidade humana de pensar, criar e intuir as coisas.

            Pensar a vida, naquilo que ocorre ao seu redor, analisar as razões de ser das coisas e dos fatos, enfim, dar-se conta de que viver é mais do que comer, dormir, trabalhar etc. A vida está para além do meramente biológico. Quem se deixa afetar pelo mal da mediocridade intelectual é incapaz de perceber isso.

Intelecto medíocre é aquele tomado pela ferrugem, que somente é ativado para o desenvolvimento das funções básicas e fisiológicas do humano. Isto é muito pouco. Isto integra tão somente a nossa animalidade. Os animais não sabem que sabem, apenas sentem, desejam, imitam e sofrem. O animal não se ocupa com o próprio pensamento, porque é irracional. Há humanos que levam uma vida semelhante: passam pela vida sem se ocupar com o próprio pensamento. O que enxergam em si mesmo costuma ser a cópia dos outros.

            A pessoa medíocre, intelectualmente falando, desconhece a evolução da vida e de tudo o que nela ocorre. Entre outros motivos, isto ocorre porque se encontra acomodada em um mundo criado para si mesma. Em outros termos, o medíocre não enxerga com criticidade o que acontece ao redor, porque se encontra ocupado com a mesmice de suas ideias, repetidas e sem conexão com o mundo exterior, e com os afetos mesquinhos que daí decorrem.

Afetos mesquinhos geralmente são egoísticos, pois não são construídos a partir do encontro com o que é diferente. O diferente aparece praticamente como inimigo do medíocre, graças à ausência de esforço intelectual, necessário à realização de uma correta compreensão das diferenças. Esta dificuldade também é ocasionada pela mania de imitação que domina a vida do medíocre. Quem nada cria, termina por imitar, caindo na mesmice que marca a rotina.

             A mera imitação é própria de quem sofre de outro mal terrível, muito comum em nossos dias: o da preguiça mental. Como criar o novo sem fazer o mínimo esforço mental? Como repensar ideias e comportamentos, sem colocar em prática a arte de pensar? A preguiça mental gera uma sociedade bestializada. Parece ser isto que estamos enxergando hoje no Brasil: o domínio da ignorância, que leva o ser humano a comportar-se como animal. Esta bestialização multiplica o número dos imbecis, também denominados tolos ou idiotas, que são aqueles de curta inteligência, facilmente entregues às mãos dos espertos e aproveitadores.

            É importante salientar outra característica dos que são afetados pela mediocridade intelectual: apresentam incapacidade para o diálogo. Isto decorre da falta de abertura para o novo, ocasionada pelo desinteresse e pelo mínimo de estrutura mental para dialogar. O diálogo obriga o pensar. Portanto, não é próprio dos que são dominados pela preguiça mental. No diálogo há sempre uma necessidade de esforço e disposição para compreender, analisar, ponderar, escutar, propor, pensar e repensar, rever, ceder e acolher, ensinar e aprender. Um medíocre é incapaz de entrar e permanecer na dinâmica do diálogo, pois é intolerante e autoritário.

            Assim, o medíocre é alguém muito limitado, que se encontra na superfície. Nunca se arrisca a mergulhar para as águas mais profundas da razão que tudo verifica e aprofunda. Aprofundamento é uma palavra que causa tédio no medíocre, pois está habituado à superfície daquilo que é concebido. Geralmente, costuma repetir o que os outros dizem, sem analisar. Muitas vezes, chega a brigar por pontos de vista que não são seus, mas de outros considerados “autoridades no assunto”.

Os que ousam pensar defendem a tese de que estas “autoridades” são passíveis de equívocos e aperfeiçoamentos. Não há dúvidas de que os especialistas no assunto são apreciados pelos que ousam pensar, mas estes nunca aceitam, literalmente, o que aqueles afirmam de forma sempre transitória. Para quem ousa pensar, tudo pode ser repensado e analisado.

            Quando a maioria dos que constituem determinado grupo ou sociedade repete, sem cessar, sem análise criteriosa, aquilo que uma minoria pensou e elaborou para a maioria, então temos um grupo ou sociedade medíocre. Neste tipo de sociedade, todo mundo repete as mesmas coisas.

Praticamente não há conflitos inteligentes e saudáveis de ideias, com o objetivo de possíveis aperfeiçoamentos do que está estabelecido. O que está estabelecido é facilmente aceito como certo, como verdade inquestionável, como caminho único. Parece não existir outras possibilidades, porque estas não podem ser pensadas. No universo religioso, isto aparece com mais força, devido à tendência preponderante ao dogmatismo e à sacralização do argumento de autoridade.

            Parece não existir outro caminho de libertação da mediocridade intelectual senão o empenho na arte de pensar e repensar todas as coisas e realidades. É preciso estudar muito; gastar tempo com análises e reflexões. É necessário, como dizia o filósofo Immanuel Kant: “ousar saber!” Quem não ousa saber, torna-se escravo da ignorância, e quem ignora termina por ser dominado por quem conhece, pois o conhecimento confere poder.

O medíocre é um sofredor, porque não existe liberdade sem o pensar. Há um ditado popular que diz: “quando a cabeça não pensa, o corpo padece!” Não há luz sem conhecimento. Também na religião cristã se afirma a necessidade do conhecimento de Deus. Há muita gente sofrendo por causa da mediocridade intelectual; sofrendo porque prefere permanecer na zona de conforto da ignorância (zona nada confortável aos de espírito inquieto!), dedicando boa parte do precioso tempo da vida em conflitos com aqueles que vivem buscando a sabedoria. Esta é o passo imediatamente posterior que integra o caminho dos que buscam conhecer.

Tiago de França

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