sexta-feira, 13 de março de 2020

Algumas considerações sobre os sete anos de pontificado do Papa Francisco


“A Igreja não está no mundo para condenar, mas para promover o encontro com aquele amor visceral que é a misericórdia de Deus. Para que isso aconteça, é necessário sair. Sair das igrejas e das paróquias, sair e ir à procura das pessoas onde elas se encontram, onde sofrem, onde esperam” (Papa Francisco).
            Na noite do dia 13 de março de 2013, Francisco iniciava o seu pontificado. Apresentou-se com muita humildade, dizendo que foram buscá-lo no “fim do mundo”. Para a Diocese de Roma, o colégio de cardeais elegeu um Papa latinoamericano, algo inédito na história da Igreja. Sucessor de um alemão erudito, versado na Teologia, Francisco tem a marca do pastor com cheiro de ovelhas. Não é um teólogo, no sentido profissional do termo, mas um pastor marcado pela misericórdia de Deus.
            Apesar de não ser teólogo, o magistério pontifício de Francisco é extraordinário. Não é um Papa desprovido de conhecimento sobre as coisas de Deus; pelo contrário, como um bom jesuíta, é experimentado no discernimento e um buscador de Deus em todas as coisas. A teologia de Francisco é prática, profundamente pastoral. Esta é a teologia necessária, pois de nada serve o conhecimento que não possui uma finalidade prática; no caso da teologia, uma finalidade pastoral.
            Francisco sabe ser simples e profundo, sabe inquietar as consciências adormecidas, e sabe também provocar inquietação nos acomodados e nos covardes. É um Papa que mexe com aqueles que o conhecem, que entram em contato com seus gestos e pensamentos. Não fala nem age para agradar, mas para provocar a mudança de vida e de mentalidade. Neste sentido, aprendeu bem a lição ensinada por Jesus a seus discípulos. Jesus ensinava a anunciar com destemor e ternura, com mansidão e alegria.
            Com poucos meses de pontificado, em 2013, o Papa publicou a sua primeira exortação apostólica, intitulada “A alegria do evangelho”, sobre o anúncio do evangelho no mundo atual. Após a renúncia do Papa Bento XVI, a Igreja estava precisando conhecer melhor a alegria do evangelho, pois sempre reinou em seu seio uma certa tristeza, um certo modelo de Igreja marcado pelo medo (penitências, condenações, sofrimentos etc.). O acento excessivo da morte fez muita gente não celebrar a Páscoa do Senhor, em todos os âmbitos da vida da Igreja.
            De fato, a alegria faz parte da vida do Papa Francisco. Ele vive a experiência da alegria do evangelho. Por onde anda, irradia alegria. O cristão é uma pessoa alegre, porque se encontrou com Jesus. É com a alegria de viver unido a Jesus que Francisco enfrenta as dificuldades de sua missão pontifícia. Seus opositores, que foram surgindo ao longo destes sete anos, são pessoas tristes e raivosas, invejosas e apegadas a tudo aquilo que ele denuncia: o apego ao poder, dinheiro e prestígio; o clericalismo, que sempre fez mal à Igreja; o capitalismo selvagem, que escraviza e mata; a globalização da indiferença, que ceifa a vida de milhões de pessoas; a cultura do acobertamento dos abusos sexuais de menores, cometidos por clérigos, verdadeira ferida aberta no corpo eclesial; e tantos outros males que ferem a dignidade da pessoa humana.
            Francisco é um Papa do Vaticano II, marcado por uma eclesiologia de comunhão e participação, promotor do caráter sinodal da Igreja. Seu proceder não promove nem reforça atitudes proselitistas e de fechamento ao mundo; seu linguajar é simples e provoca proximidade. Seu estilo de ser Papa nos recorda que o Papa não é um ser supremo, angelical, supranatural, dotado de poderes sobrenaturais e conhecedor de mistérios que vão além do mistério de Cristo e da Igreja. Nada disso. Francisco, com seu testemunho, ensina que o Papa é o Bispo da Diocese de Roma, o Irmão entre os irmãos, chamado a confirmar na fé os que seguem Jesus em comunhão com a Igreja.
            No seio da Igreja, clérigos e leigos, que apreciam e fazem uso da pomposidade na liturgia e nas vestes, que gostam do brilhantismo, que possuem mania de grandeza e espírito de superioridade, e que promovem a centralização de poder, geralmente não gostam de Francisco, pois nele não há nada disso. E não há porque em Jesus também não encontramos tais coisas. Na Igreja temos essas coisas, mas são contrárias ao evangelho de Jesus Cristo. Ainda não temos uma Igreja pobre para os pobres. Este é um sonho que ganhou espaço na concepção de Igreja de Francisco, em suas palavras e gestos.
            A oposição ao Papa Francisco é a oposição a um modelo de Igreja. Geralmente, os opositores de Francisco defendem o modelo eclesial de cristandade, marcado pela centralização de poder, pelo espírito de hegemonia, pela ênfase na disciplina e características exteriores em detrimento do despojamento e do espírito evangélico de serviço aos pobres e oprimidos. Este modelo de cristandade foi suplantado pela pós-modernidade. Francisco sabe e ensina que não estamos mais na época em que a Igreja era escutada pelas pessoas, governos e instituições. Vivemos na época do desprezo ao sentimento e aos símbolos religiosos. Quando estes são considerados, na verdade, são manipulados para servir a interesses opostos aos de sua finalidade religiosa.
            O modelo de Igreja do Vaticano II, que Francisco tem insistido em promover, é o de uma Igreja acolhedora, chamada a promover o encontro com a misericórdia de Deus; uma Igreja que conduz as pessoas ao encontro com Jesus, encontro capaz de conferir um novo sentido à vida. Uma Igreja aberta ao diálogo, que não se coloca acima das demais instituições; uma Igreja advogada dos pobres e servidora do evangelho de Cristo Jesus. O Papa tem trabalhado incansavelmente para que este modelo cresça e prevaleça.
            Por fim, para não cairmos no pecado da papolatria, temos que admitir que o Papa tem seus limites. Ele mesmo se declara um pecador necessitado da misericórdia de Deus, como os demais membros da Igreja. É verdade que Francisco poderia ter feito mais mudanças, mas para os sete anos de caminhada, o saldo é positivo. A reforma de uma instituição bimilenar não se faz de forma repentina. Há muitos entraves e resistências. A Igreja não está habituada a reformas. Há uma forte tendência ao espírito da mera continuidade e repetição de velhas práticas que não mais funcionam. Aos poucos, o Espírito do Senhor, que conduz a Igreja vai mostrando e promovendo a escolha e eleição de pessoas capazes de promover as mudanças necessárias.
            Francisco está sendo um dom do Espírito à Igreja. É um semeador de sonhos e esperanças, um homem de Deus que foi enviado para apontar para o evangelho de Jesus. Muito do que Francisco está semeando na Igreja, somente no futuro colheremos os frutos. No coração de muita gente está sendo semeada a semente do evangelho. Dentro e fora da Igreja, muitas pessoas estão conhecendo a alegria do Evangelho. E esta alegria é contagiante; quem a experimenta é transformado em portador da esperança ativa. Francisco é uma das surpresas de Deus nestes tempos sombrios de muita violência, destruição e morte; é uma prova de que Deus não deixa faltar os profetas, enviados no tempo oportuno, segundo os desígnios de Deus.

Tiago de França

2 comentários:

Unknown disse...

Excelente reflexão

Unknown disse...

Texto repleto de significados