segunda-feira, 20 de julho de 2020

O dom da amizade


“Já não vos chamo de servos, porque o servo não sabe o que faz seu senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi do meu Pai” (Jo 15,15).
            Muito difícil é a vida de quem não tem amigos. A amizade é um dom que se recebe quando saímos do isolamento de uma vida medíocre e vazia. Na verdade, ela liberta a pessoa da mediocridade. Assim como um jardim bem cuidado, cheio de cores e de vida, a amizade confere e mantém o colorido da vida. Esta deixa de ser insossa e triste.
Os amigos nos recordam o valor do companheirismo, mesmo quando estão distantes. Quem tem amigos não experimenta a solidão, mesmo quando esta, às vezes, é necessária. A solidão enquanto pausa é uma necessidade dos espíritos evoluídos.
            A amizade possui algumas características que revelam a sua importância. A primeira delas é a gratuidade. Amigos não se compram, se conquistam. Aí aparece uma segunda característica: a empatia. Uma pessoa amarga revela que é mal resolvida, e provoca afastamento. A empatia requer suavidade, bom humor, destreza e altruísmo. Quem tem empatia atrai, porque causa no outro uma sensação de bem-estar. Aqui aparece outra qualidade valiosa: a proximidade. Esta resulta da empatia, porque provocada por aqueles que sabem enxergar o que o outro tem de bom e positivo.
            A alegria também caracteriza a amizade. Ninguém procura o outro para entristecê-lo. Pelo contrário, o abatimento e a tristeza conduzem ao outro para a partilha fraterna dos dilemas que provocam tal estado de ânimo. Quem tem amigos possui a possibilidade permanente de ser ouvido, pois a escuta também marca a experiência da amizade. Escutar é uma virtude que se torna rara, numa sociedade barulhenta e de muitos discursos. As pessoas tendem a falar mais e escutar menos, criando um clima de dispersão e irritação.
            O verdadeiro amigo é aquele que confia no outro. Não há amizade sem confiança. Esta deve ser recíproca e pautada na verdade. A confiança somente aparece quando se tem a certeza de que o outro não é falso. Onde há falsidade não há verdade e, consequentemente, não pode existir confiança. Na amizade o crescimento humano e espiritual é mútuo e sem fim. A partilha das alegrias e tristezas, conquistas e fracassos, numa relação confiante e sincera, é alegria para o coração e o espírito, é puro dom.
            A amizade também liberta a pessoa de outro terrível mal que fere a dignidade do ser humano: a autossuficiência. Uma pessoa autossuficiente é insuportável porque é ensimesmada e, portanto, cheia de si mesma. Comporta-se como se fosse uma divindade, bastando-se a si mesma. Por isso, vive uma ilusão, porque pensa que não precisa do outro nem do Outro (Deus).  
Os autossuficientes são orgulhosos e prepotentes, e mesmo quando se dão mal, querem aparecer como pessoas que meramente fraquejaram por um momento. Como diz o povo, querem ficar sempre por “cima da carne seca”. Trata-se de viver segundo as aparências, passando uma falsa imagem de si mesma. No fundo, tais pessoas sofrem muito. São um pouco masoquistas.
            Os amigos nos recordam também de que não se pode viver neste mundo sem a comunicação aberta e transparente com os outros. A comunicação é um fenômeno que acontece de várias formas. Os amigos sempre percebem quando algo está fora do lugar, porque a amizade imprime percepção do outro.
Quando este chega, por exemplo, ao suicídio, e ninguém percebe, então essa percepção do outro estava ausente ou bastante comprometida. O outro sempre expressa seus sentimentos e, muitas vezes, não o faz por meio da fala. A atenção ao outro é importante.
            Essa comunicação não precisa ser, necessariamente, constante. Na amizade não existe um tempo estipulado de comunicação. Cada experiência é única. Há amigos que passam o dia se comunicando; há outros que quase não se comunicam. A necessidade e o estilo de cada pessoa ditam a constância da comunicação.  
Quando a amizade é verdadeira, amigos que não se falam nem se veem com certa constância mantém a amizade normalmente; e quando se reencontram, é como se tivessem se encontrado no dia anterior. É algo muito gratificante.
            Querer o bem do outro é uma característica fundamental da amizade, é como que o alicerce sobre o qual está fundada. Este querer evita outro grande mal que tende a destruí-la: transformar o outro em objeto de satisfação dos próprios interesses. A pessoa interesseira não tem amigos.
Aproximar-se do outro somente para aproveitar-se dele é algo abominável. Claro que os amigos se ajudam, mutuamente. Mas dirigir-se ao outro somente quando há necessidade de alguma coisa é demonstração evidente de mera satisfação de interesse, e nada mais. É preciso estar atento aos que agem dessa forma. Não é bom alimentar esse tipo de comportamento.
            Este querer exige disponibilidade para servir. O outro precisa ter a certeza de que tem amigos para acompanhá-lo na caminhada da vida. A fé cristã revela que Deus é o grande Amigo. No versículo que introduz este artigo temos a explicação desta verdade. Jesus, Deus e homem verdadeiro, não nos trata como servos, mas como amigos. E o motivo é simples: Ele nos faz participar da vida divina. O amigo participa da vida do outro. Em Cristo Jesus, os amigos são irmãos na fé.
            Jesus é o amigo que nos revela os segredos de Deus. E o maior segredo divino é a misericórdia. Na amizade é possível exercê-la. Quem se aproxima de Jesus e com ele caminha, tem tudo na vida. A pessoa pode perder tudo, mas se tem amizade com Jesus, a vida está em segurança.
Ele é o modelo por excelência do amigo fiel, que jamais abandona aqueles que se abrem à sua presença e companhia. Sua amizade se manifesta na amizade sincera que seus discípulos têm, uns para com os outros. Portanto, o discípulo de Cristo é amigo das pessoas, e não o contrário. Quem semeia inimizade não participa da amizade com Jesus.
            Jesus é o modelo porque presenteia seus amigos com o dom da sua própria vida, dando-se a si mesmo na cruz e no partir do pão. Não existe presente melhor. Ele se doa e ensina a sermos doados. Amizade é doação de si mesmo para o bem do outro. Em um mundo marcado pela indiferença, a amizade é sinônimo de proximidade, ternura, atenção e cuidado. O amigo sempre deseja o bem, e fica feliz com a felicidade do outro. Por isso, a inveja destrói a amizade, porque provoca rivalidade, desembocando na falta de comunhão fraterna.
            Certos de que não caminhamos sozinhos na vida, os amigos são tesouros inestimáveis, que precisam de cuidado e valorização. Toda pessoa tem valor, e os amigos mais ainda. Diz o ditado popular que “mais vale ter amigos na praça do que dinheiro no caixa”. Isso significa que eles são um apoio seguro também nas necessidades materiais. Mas o maior socorro que o amigo nos presta é o do seu amor generoso e fiel. Na amizade o amor se manifesta. Jesus amava os seus amigos (cf. Jo 11,5), e este amor o confortava, reanimava e auxiliava na missão.
            Quem deseja cumprir fielmente a sua missão neste mundo precisa da ajuda dos amigos. O mesmo se diga da busca pela felicidade: Ninguém é feliz sozinho. A felicidade está intimamente ligada à amizade. Procurar o próprio bem-estar ignorando bem do outro é atitude de gente egoísta, e no egoísmo não existe felicidade. Os egoístas têm colegas, não amigos.
Em todo lugar encontramos pessoas abertas e disponíveis, empáticas e apreciadoras de uma boa amizade. Há também as que não querem amizade. Quanto a estas, a gente deixa que sigam seu caminho, porque a amizade acontece na e para a liberdade. Quanto mais liberdade, mais autêntica e duradoura a amizade.
Nossos verdadeiros amigos nos ajudam a ser pessoas melhores, mais humanas e fraternas. Para isso, são sinceros e sempre nos falam a verdade. Por mais dolorosa que seja, é a verdade que liberta. A amizade é espaço de verdade e liberdade. Sejamos, pois, amigos sinceros, livres e generosos. O mundo está muito necessitado de relações pautadas na amizade.

Tiago de França

8 comentários:

silvanialima1032@gmail.com disse...

Muito bom,amei esse texto que Deus te abençoe hj e sempre

Unknown disse...

Amei seu texto.Que Deus lhe proteja e aumente cada vez mais sua sabedoria. Um forte abraço. Lhe considero um bom amigo.

Adriano Couto disse...

Muito bom o texto! Parabéns!

ViviBBrust disse...

Maravilhoso... A gente vai lendo, e os amigos chegam aos poucos, em lembrança, memória, saudade...

Tiago de França disse...

Obrigado! Amém!

Tiago de França disse...

Obrigado! Amém! Como é seu nome e de onde você é mesmo?

Tiago de França disse...

Obrigado!

Tiago de França disse...

Obrigado!