“Quando é autêntica, a oração
é livre dos instintos de violência e é um olhar dirigido a Deus, a fim de que
Ele volte a cuidar do coração do homem” (Papa Francisco).
Não existe vida cristã sem oração. Isso
significa que o discípulo de Jesus é alguém que reza sem cessar, porque assim o
Mestre ensinou a fazer (cf. Lc 18,1-8). Interessante como o evangelista faz
questão de dizer que a parábola da viúva e do juiz contada por Jesus foi dirigida
aos seus discípulos para “mostrar-lhes a
necessidade de orar sempre, sem nunca desistir”. A viúva insiste em pedir
ao juiz que lhe faça justiça. O juiz não temia a Deus, nem tinha respeito por
homem algum, mas fez justiça à viúva.
As palavras de Jesus é uma chamada
de atenção a todo aquele que deseja segui-lo mais de perto: “Escutai bem o que disse esse juiz injusto!
E Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que clamam a ele dia e noite? Ele
os fará esperar?” Deus é Justo e não deixa de escutar o clamor de seus
filhos e filhas. Não é surdo, nem inerte, mas amoroso e compassivo, atento ao
que se passa no mundo. Jesus revelou que o Pai não é indiferente ao que se
passa com seus filhos e filhas. Ao rezar, o cristão precisa considerar essa
verdade.
É preciso rezar com perseverança,
para que Deus escute e interfira no momento oportuno. Na oração, aprende-se o
momento da ação divina. Não se impõe a Deus o que deve fazer e quando fazer. A
oração, em primeiro lugar, não está destinada a ser uma oportunidade para dizer
a Deus o que ele deve faze e como fazer. Rezar é “um olhar dirigido a Deus”. Mesmo que não se tenha palavra, nem se
saiba o que dizer, basta olhar para Deus, colocar-se na sua presença. Muito
antes de qualquer expressão, Ele, que conhece todas as coisas, também conhece o
que se passa na vida e no coração de todos.
Mas como é Pai, é do seu agrado que
o busquemos sem cessar. Em todo momento pode ser encontrado, porque não é
ausente, nem indiferente. Está presente em toda parte, e em toda parte pode ser
invocado. Ele está na brisa suave (cf. 1Rs 19,9-18), chamando os seus
escolhidos para escutar a sua palavra, conhecer seus desígnios e seu amor.
Rezar é entrar em comunhão com o Amor. Trata-se de uma comunhão marcada pela
leveza, suavidade, proximidade, silêncio, escuta amorosa, discernimento, paciência,
perseverança, paz... Deus não é violento, mas pacífico. Os que rezam, tornam-se
pacíficos e pacificadores.
Que reza experimenta o amor e a paz
que vem de Deus. É inconcebível e inaceitável que alguém viva em comunhão com
Deus e, ao mesmo tempo, seja maldoso com o próximo. A bondade é fruto da
oração, e a paz também. A oração faz a pessoa ser conforme a vontade divina:
amorosa, serena, firme, decidida, acolhedora, aberta ao diálogo e ao perdão,
solidária, paciente, alegre... A oração abre os olhos das pessoas para a visão
de Deus.
Os que se entregam à oração enxergam a Deus no cotidiano
simples da vida. Deus age de forma sutil, discreta, sem chamar a atenção; não
gosta do espetáculo, porque não precisa disso para ser Deus. Deus não tem
carência, porque é pleno. Seu amor é abundante e expansivo, e sempre está
semeando esse amor nos corações daqueles que escutam a sua voz na oração e nas
circunstâncias da vida. Rezar é entregar-se ao mistério de Deus, que fala e
brota do coração.
Na vida da Igreja, temos a oração comunitária e a oração
pessoal. Enquanto membros da Igreja, somos uma comunidade orante, que oferece
ao Pai um sacrifício de louvor. Na liturgia da Igreja a obra da salvação é
continuada (cf. constituição Sacrosanctum
concilium – sobre a sagrada liturgia, n. 6). Na oração particular ou
pessoal, cada cristão se coloca diante de Deus, em comunhão com toda a Igreja.
Apresenta-se como membro do povo de Deus, não como alguém isolado, buscando a
satisfação de seus desejos. A oração não se presta à mera satisfação dos
desejos humanos.
Na oração sincera e livre de todo interesse mesquinho, Deus
vem para “cuidar do coração do homem”.
Vejam a beleza dessas palavras do Papa Francisco! É a expressão de um homem que
aprendeu a rezar. A oração também é uma escola na qual se aprende a viver em
comunhão com Deus. Não se aprende a rezar fazendo cursos de oração. Aprende-se
a rezar, rezando. A melhor oração é aquela que brota do coração, das entranhas
da pessoa. Diante de Deus, o Espírito do Senhor faz a pessoa dizer a Deus
expressões belas e filiais, porque este Espírito sonda todas as coisas, “até mesmo as profundezas de Deus” (1
Cor 2,10). O Espírito de Deus intercede por nós e vem em socorro de nossa
fraqueza (cf. Rm 8,26-27).
Os cristãos rezam para caminhar na presença de Deus, de
braços abertos para acolher e amar o próximo. A oração conduz ao amor a Deus e
ao próximo. Não se deve rezar para fechar-se em si mesmo, nem para se sentir
superior aos outros. Quem assim procede, na verdade, não reza, mas conversa
consigo mesmo, jamais com Deus. Não vive a comunhão com Deus. Esta comunhão
passa, necessariamente, pela relação amorosa com os outros. O cristão reza para
ter coragem, disposição, abertura, compreensão e perseverança no amor a Deus e
ao próximo como a si mesmo.
A oração cultiva o amor no coração daquele que reza, e este
amor o liberta da cultura do ódio e da indiferença que tende a dominar o mundo
e as pessoas. Quem reza se coloca sempre na fileira dos servidores do
Evangelho, jamais na dos egoístas e indiferentes ao sofrimento dos pobres e
injustiçados. Quem reza é sensível ao que se passa no mundo; do contrário, está
confundindo oração com outra coisa. Portanto, o cristianismo e o mundo precisam
de pessoas que se entreguem à oração e ao amor que daí decorre.
Hoje, é preciso rezar pela unidade dos cristãos, dentro e
fora da Igreja católica. Esta oração conduz ao reconhecimento da necessária
comunhão eclesial. Aliás, mais do que reconhecimento, conduz, sobretudo, a
atitudes geradoras de comunhão. Não adianta rezar nas igrejas e agir de forma
contrária ao que se diz na oração comunitária e pessoal. Não adianta abrir a
boca para dizer que Deus é amor, e na prática cultivar o ódio nas relações
interpessoais. Deus não escuta a oração dos insensatos e hipócritas, mas escuta
o humilde, que bate no peito, reconhecendo seu pecado, colocando-se numa
atitude de arrependimento e acolhida de Deus. Deus não escuta a prece dos que
confiam na sua própria justiça e desprezam os outros (cf. Lc 18,9-14).
Tiago de França
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