terça-feira, 26 de maio de 2020

Servir na comunhão

A semana que antecede a solenidade de Pentecostes é denominada Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos. Orar pela unidade dos cristãos é uma necessidade permanente, porque, infelizmente, a falta de unidade no cristianismo é motivo de escândalo no mundo. Não agrada a Deus o conflito entre cristãos que professam a fé em Jesus, acusando-se mutuamente e, desse modo, manifestando escandalosa contradição com o apelo de Jesus à unidade (cf. Jo 17,21).
No seio das Igrejas cristãs não se pode cair noutra contradição, que consiste em orar pela unidade dos cristãos e, na prática, proceder de forma contrária. Quem ora deve proceder conforme a oração dirigida a Deus. Exemplo, quando nos dirigimos ao Pai com a oração que Jesus nos ensinou, o Pai nosso, temos que ter a clareza de que o Pai não é propriedade de uma pessoa, nem de uma denominação religiosa. O Pai é nosso. No cristianismo, acredita-se que o Pai é o Deus do universo, e a salvação em Jesus Cristo é universal, ou seja, dirigida a todos.
O exclusivismo não deveria existir no seio da religião cristã. Diante de Deus, não há cristãos privilegiados em detrimento de outros. Deus não faz acepção de pessoas (cf. At 10,34). Ele trata a todos com igual amor, porque todos são seus filhos e filhas. Como bom Pai que é, dirige-se especialmente aos filhos mais vulneráveis, mais expostos às forças do pecado e da morte. Mas a todos quer bem, a todos deseja salvar. Todos os que acreditam no nome de Jesus são nele glorificados, porque é do desejo de Deus que todos o conheçam através do Filho e no Espírito (cf. Jo 17,1-11a).
Cada cristão é chamado a desempenhar um serviço no mundo: o serviço do anúncio da Boa notícia do Reino de Deus. Esta missão precisa ser desempenhada, levando-se em conta a comunhão. Em outras palavras, não é possível anunciar o Evangelho do Reino fora da comunhão fraterna. Quem iria acreditar na palavra de quem anuncia a unidade e pratica a desunião?
Anúncio é testemunho de unidade e paz. Ninguém é feliz vivendo fora da unidade geradora da paz, porque esta é "o anseio profundo de todos os homens de todos os tempos" (Papa São João XXIII, carta encíclica Pacem in Terris, n. 1). Este anseio somente encontra a sua realização quando a unidade é buscada e vivida por todos, cristãos e não-cristãos.
Por isso, aqueles que, no seio das Igrejas cristãs, anunciam o Evangelho, mas no cotidiano de suas vidas e até durante o culto prestado a Deus, dedicam-se a ofender o sentimento religioso e a diversidade das manifestações religiosas presentes no cristianismo e nas demais religiões, pecam gravemente contra o Evangelho que pregam. Infelizmente, temos muitos líderes religiosos, em todas as Igrejas cristãs, que são inimigos da unidade cristã. Não podemos tolerar esse tipo de conduta, pois quem se opõe à unidade cristã se apõe ao próprio Deus.
Toda a humanidade forma, aos olhos de Deus, uma única família. Portanto, não há razão para pensar que uma Igreja é superior à outra, ou que uma religião é verdadeira e as demais são falsas. O discurso do falso e verdadeiro em matéria religiosa não promove a unidade entre as pessoas. O católico não está autorizado a desmoralizar os demais cristãos de outras Igrejas, nem os destas tem o direito de fazer o mesmo com os católicos. O desrespeito e a competição entre Igrejas cristãs constituem um terrível contratestemunho, que provoca em inúmeras pessoas certa indisposição em acolher o Evangelho de Jesus.
A Bíblia revela que quando Deus olha para as pessoas, não busca, em primeiro lugar, saber da sua religião. Não é a religiosidade de uma pessoa que a salvará. Ninguém será salvo por pertencer e praticar as normas de determinada religião. A salvação é gratuita, e os que a aceitam procedem conforme o mandamento de Jesus: O amor a Deus e ao próximo como a si mesmo. Este mandamento deve estar no centro da vida cristã, e não a religião com suas normas. Religião é meio e não fim. Portanto, é instrumento que deve servir para unir as pessoas e conduzi-las a Deus, e não o contrário.
Por fim, cabe ainda dizer que o cristão que se julga fiel a Deus, mas vive ocupado com brigas e disseminação do ódio em nome da fé em Jesus, precisa se converter, pois não compreendeu o Evangelho de Jesus. Ninguém foi enviado por Jesus para disseminar o ódio em nome de Deus. A ninguém Jesus pediu isso. O cristão, batizado em nome de Deus, deve ser pessoa do diálogo, da amizade, do encontro, da alegria, do amor e da fé que une a todos. Isso significa servir na comunhão e, assim, viver a fraternidade exigida por Jesus.
           
Tiago de França

Nenhum comentário: